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quinta-feira, 13 de março de 2014

FRATURAS E DEFORMAÇÃO RÚPTIL

Estruturas rúpteis como juntas e falhas são encontradas em quase toda a superfície da Terra sólida. A deformação rúptil é a marca registrada da deformação na crosta superior, ocorrendo em áreas onde os esforços se acumulam em níveis que excedem o limite local de resistência à ruptura da crosta. As estruturas rúpteis podem formar-se de modo suave, por desenterramento e resfriamento das rochas, ou de modo lento, durante os terremotos. Em ambos os casos, a deformação rúptil causada pelo fraturamento implica um rompimento instantâneo das estruturas cristalinas na escala atômica, e esse tipo de deformação tende a ser não apenas mais rápido, mas também mais localizado que a deformação plástica. As estruturas rúpteis podem ser estudadas com relativa facilidade em laboratório, e a união de dados experimentais com observações de campo e de lâminas petrográficas constitui a base do nosso conhecimento atual sobre a deformação rúptil.

1 Mecanismos de deformação rúptil

Assim que o esforço diferencial excede certo limite em rochas não fraturadas, a rocha pode acumular uma deformação permanente por fluxo plástico, como visto no Cap. 6. No regime friccionaI ou regime rúptil, entretanto, a rocha irá se deformar por fraturamento quando sua resistência à ruptura for excedida. Durante a deformação rúptil, os grãos são moídos e reorganizados, e a deformação torna-se mais localizada. 

O REGIME RÚPTIL É AQUELE EM QUE AS CONDIÇÕES FÍ­SICAS PROMOVEM MECANISMOS DE DEFORMAÇÃO RÚPTIL, TAIS COMO DESLIZAMENTO FRICCIONAL AO LONGO DE CONTATOS DE GRÃOS E ROTAÇÃO E FRATURA DE GRÃOS.

Em alguns casos, é importante caracterizar a quantidade de fraturas em uma rocha deformada e distinguir a deformação rúptil que envolve fraturas daquela que não as envolve. A deformação friccio­naI sem a geração de fraturas ocorre tipicamente em rochas porosas fracamente consolidadas e em sedimentos (solos). Nessas rochas e sedimentos, o deslizamento friccionaI ocorre ao longo dos limites existentes de grãos, e o espaço dos poros permite que os grãos se movam em relação aos grãos vizi­nhos, como mostrado na Fig. 7.1A. Dessa forma, os grãos acomodam o deslizamento friccionaI em suas bordas por translação e rotação, mecanismo deno­minado fluxo particulado ou fluxo granular. Como sempre ocorre no regime rúptil, o deslizamento nas bordas de grãos é influenciado pela fricção e, por­tanto, o mecanismo é denominado deslizamento friccionaI. Assim, uma certa resistência ao desliza­mento, controlada pela fricção, deve ser superada para que o deslizamento friccionaI ocorra. Isso não deve ser confundido com o deslizamento não fric­cionaI que ocorre nos limites de grãos em regime plástico (Cap. 10).

O ângulo de repouso em uma areia inconsoli­dada é controlado pela fricção entre os grãos indivi­duais de areia. Quanto maior a fricção, maior o ân­gulo de repouso. Nesse caso, a gravidade exerce um esforço vertical nas áreas de contato entre os grãos, e o esforço de cisalhamento irá depender da orien­tação das superfícies, como discutido no Cap. 4.

O deslizamento friccionaI de grãos pode ser am­plamente distribuído pelo volume da rocha, mas também pode localizar-se em zonas ou bandas de espessura milimétrica a decimétrica. O fluxo gra­nular resulta em uma zona de cisalhamento dúctil onde a laminação pode ser traçada continuamente de um lado a outro da zona. Esse é um tipo de zona de cisalhamento dúctil governado por mecanismos de deformação rúptil.

Em outros casos, há a formação de novas fratu­ras durante a deformação. Isso sempre acontece na deformação rúptil permanente de rochas não poro­sas, mas também pode afetar rochas porosas se o esforço nas áreas de contato entre os grãos for su­ficientemente alto. Nas rochas porosas, as fraturas intragranulares são frequentes (Fig. 7.2A). As fratu­ras intergranulares são fraturas que se estendem por diversos grãos (Fig. 7.2B) e que caracterizam rochas não porosas ou pouco porosas deformadas em regime rúptil. A fratura e o esmagamento de grãos, associados ao deslizamento friccionaI ao longo de contatos entre grãos e à rotação de grãos, são de­nominados catáclase. Intensa catáclase ocorre em zonas delgadas ao longo de superfícies ou de fa­lhas de deslizamento onde acontece uma extrema redução do tamanho dos grãos. Uma deformação cataclástica moderada pode ocorrer em zonas mais largas de cisalhamento rúptil ou cataclástico. Nesse caso, os fragmentos resultantes do esmagamento dos grãos fluem durante o cisalhamento, processo denominado fluxo cataclástico (Fig. 7.1B).

Um esmagamento proeminente, mas sem evi­dências de deslocamento por cisalhamento, tam­bém pode ocorrer, e é denominado pulverização. O processo de pulverização não é muito bem compre­endido, mas parece estar relacionado a taxas muito altas de deformação (> 100 s-1) durante fortes ter­remotos, que produzem taxas de ruptura muito ele­vadas.



2 Tipos de fraturas

2.1 O que é uma fratura?

No senso estrito, uma fratura é qualquer descontinuidade plana ou subplana, delgada em uma direção em comparação às outras duas e formada por esforço externo (p. ex., tectônico) ou interno (térmico ou residual). As fraturas representam descontinuidades nas propriedades mecânicas e desloca­mentos físicos nos locais onde as rochas são rompidas, e a redução ou a perda de coesão caracterizam a maioria das fraturas. Elas são sempre descritas como superfícies, mas, dependendo da escala de observação, há sempre uma espessura a ser consi­derada. As fraturas podem ser divididas em fratu­ras de cisalhamento (superfícies de deslizamento) e fraturas abertas ou de extensão (juntas. fissuras e veios), como ilustrado nas Figs. 7.3 e 7.4. Podem ser definidas, ainda, fraturas de fechamento ou de contração.

AS FRATURAS SÃO ZONAS BASTANTE DELGADAS, EM GE­RAL CONSIDERADAS COMO SUPERFÍCIES, E ESTÃO RELACIO­NADAS A DESCONTINUIDADES NAS PROPRIEDADES MEC­NICAS (RESISTÊNCIA OU RIGIDEZ) E A DESLOCAMENTOS.

Uma fratura de cisalhamento ou superfície de deslizamento é uma fratura ao longo da qual há um movimento relativo, paralelo à fratura. O termo fra­tura de cisalhamento é, em geral, usado para fraturas com deslocamento pequeno (escala de mm a dm), ao passo que o termo falha é comumente aplicado a descontinuidades com rejeito maior. O termo super­fície de deslizamento é usado para fraturas com movi­mentos paralelos à fratura, independentemente da magnitude de deslocamento, e é compatível com o uso tradicional do termo falha. As fraturas são comumente referidas como cracks na literatura em língua inglesa a respeito da Mecânica das Rochas e ciência dos materiais.

As fraturas extensionais são aquelas que apre­sentam extensão perpendicular às paredes. As juntas apresentam pouco ou nenhum deslocamento visível a olho nu, mas um exame detalhado revela que a maioria das juntas possui pequenos deslo­camentos extensionais através de suas superfícies e, portanto, são classificadas como fraturas exten­sionais verdadeiras. As fraturas extensionais são preenchidas por gás, fluidos, magma ou minerais. Quando são preenchidas por ar ou outro fluido, usa­mos o termo fissura. As fraturas extensionais pre­enchidas por minerais são denominadas veios, ao passo que as preenchidas por magma são classifica­das como diques. Juntas, veios e fissuras são tipos de fraturas extensionais.

As feições planas contracionais apresentam des­locamentos por contração e são preenchidas com materiais residuais (não mobilizados) da rocha en­caixante. Os estilólitos são estruturas de compac­tação com superfícies muito irregulares em vez de planas. Alguns geólogos consideram os estilólitos como fraturas de contração ou de fechamento, porque constituem claramente um dos três membros extremos no contexto das fraturas cinemáticas, juntamente com as fraturas extensionais e de cisalhamento. Essas estruturas são conhecidas, na literatura de Engenharia em língua inglesa, como anticracks.


Os experimentos de Mecânica das Rochas, desenvolvidos sob esforços diferenciais e pressões confinantes variadas, são um modo adequado de estudar diversos aspectos da formação de fraturas (Fig. 7.5), e vamos nos referir à deformação experimental de rochas em várias passagens deste capítulo (ver Boxe 7.1). De modo similar, a modelagem numérica contribui significativamente para o conhecimento do crescimento das fraturas, particularmente no campo conhecido como mecânica linear de fraturas elásticas. No campo da mecânica de fraturas é comum a classificação das fraturas em três diferentes modos (Fig. 7.6). O modo I é o modo de abertura (extensional), onde o deslocamento é perpendicular às paredes da fratura. O modo II (modo de deslizamento) representa o deslizamento (cisalhamento) perpendicular à borda, e o modo III (modo de rasgamento ou tearing mode) refere-se ao deslizamento paralelo à borda da fratura. Os modos II e III ocorrem em diferentes partes de uma mesma fratura de cisalhamento e, portanto, pode haver problemas quando nos referimos às fraturas desses modos como fraturas individuais. As combinações de fraturas de cisalhamento (modo II ou III) e de tensão (modo I) são denominadas fraturas híbridas. Adicionalmente, o modo IV (modo de fechamento) pode ser usado nos casos de feições contracionais, como os estilólitos. O modo de deslocamento nas fraturas é um parâmetro importante em alguns ca­sos, como quando, por exemplo, o fluxo de fluidos pela rocha for um aspecto relevante.



2.2 Fraturas extensionais e tracionais

As fraturas extensionais desenvolvem-se ideal­mente de modo perpendicular a σ3 e, portanto, con­têm os esforços principais máximo e intermediário (2θ = 0°). Em relação à deformação, elas se desenvolvem de modo perpendicular à direção de estiramento sob condições de tração (Fig. 7.5A), e de modo paralelo ao eixo de compressão durante os testes de compressão (Fig. 7.5B). Devido à pe­quena deformação associada à maioria das fraturas extensionais, os eixos de esforços e de deformação são relativamente coincidentes.

As juntas são o tipo mais comum de fratura de extensão na ou próximo à superfície da Terra, e ca­racterizam-se por pequenas magnitudes de defor­mação. As fissuras são fraturas extensionais mais abertas que as juntas, características de profundi­dades de até poucas centenas de metros na crosta sólida e que podem estender-se por vários quilôme­tros (Fig. 7.7).

As fraturas extensionais são típicas de deforma­ção sob baixa ou nenhuma pressão confinante, e formam-se sob pequeno esforço diferencial. Se as fraturas extensionais se formam em condições em que pelo menos um dos eixos de esforços é extensional, então essas estruturas são verdadeiras fraturas tensionais (tensile fractures). Tais condições são, em geral, encontradas próximo à superfície, onde valores negativos de σ3 são mais comuns. Elas tam­bém podem ocorrer em regiões mais profundas, na litosfera, onde a alta pressão de fluidos pode redu­zir o esforço efetivo (seção 7.6). Muitas outras juntas estão relacionadas ao alívio de carga e ao resfria­mento de rochas.



2.3 Fraturas de cisalhamento

As fraturas de cisalhamento apresentam desliza­mento paralelo ao plano de fratura e desenvolvem­-se tipicamente em um ângulo de 20° a 30° em re­lação a σ1, como demonstrado em experimentos sob pressão confinante (Fig. 7.5D,E). Esses experimentos mostram que as fraturas ten­dem a formar-se em pares conjugados, cuja bisse­triz é σ1. As fraturas de cisalhamento desenvolvem­-se em condições de temperatura e pressão corres­pondentes à parte superior da crosta. Elas também podem se formar próximo à transição rúptil-dúctil, onde tendem a crescer formando faixas mais lar­gas ou zonas de fluxo cataclástico. Tais fraturas de cisalhamento resultam em padrões de deformação que, em geral, são típicos da deformação plástica (Fig. 7.5G,H).

ENQUANTO AS FRATURAS EXTENSIONAIS SE ABREM DE MODO PERPENDICULAR A σ3, AS FRATURAS DE CISALHA­MENTO SÃO OBLÍQUAS A σ3 EM UM ÂNGULO QUE DEPENDE PRINCIPALMENTE DAS PROPRIEDADES DA ROCHA E DO ESTADO DE ESFORÇOS.

Como mencionado no capítulo anterior e mos­trado na Fig. 7.8, as deformações rúptil e plástica apresentam diferentes curvas de esforço-deforma­ção: quanto mais dúctil for a deformação, maior será a quantidade de deformação plástica acumu­lada antes do início do fraturamento. Também é interessante notar a relação entre a pressão con­finante (profundidade) e o regime de deformação (contracional ou extensional) mostrada na Fig. 7.9. Os dados experimentais indicam que a transição rúptil-plástica ocorre em pressões mais elevadas em condições extensionais, em comparação com as condições contracionais. A temperatura (Fig. 7.9) e a taxa de deformação também são fatores importantes, como foi discutido nos capítulos anteriores.





7.3 Critérios de ruptura e fratura

Vimos, no Cap. 6, que a resposta de uma rocha aos esforços depende da magnitude dos esforços ou da quantidade de deformação acumulada, além de fa­tores como anisotropia, temperatura, taxa de de­formação, fluidos dos poros e pressão confinante. No regime rúptil, uma rocha acumula deformação elástica antes de se romper (fraturar) em um dado nível crítico de esforço. Na transição rúptil-dúctil, há a tendência de ocorrer uma fase intermitente de deformação plástica antes do fraturamento rúptil; a ruptura não se propaga necessariamente através de toda a rocha como uma fratura instantânea, mas, ao invés disso, forma-se uma zona de cisalhamento dominada por fluxo cataclástico. Essa situação con­trasta com o regime plástico (Fig. 7.5J-L), em que a deformação é mais amplamente distribuída e domi­nada pelos mecanismos de deformação plástica.

Enquanto, no Cap. 6, enfocamos principalmente a deformação elástico-plástica, abordaremos aqui a deformação rúptil. As questões centrais são quando e como uma rocha se fratura. Vamos, inicialmente, analisar a primeira questão. Para uma dada rocha sob temperatura constante e pressão confinante po­sitiva e constante, o fraturamento depende do es­forço diferencial (σ1 - σ3) e do esforço médio ((σ1 + σ3)/2). Se não há esforço diferencial, o estado de es­forços é litostático, e não há forças maiores agindo em nenhuma direção em particular. A única exce­ção é o potencial de colapso da porosidade em ro­chas muito porosas, mas para a formação de fraturas nítidas é necessária, em geral, a presença de esforços diferenciais.

O INÍCIO DO FRATURAMENTO REQUER A EXISTÊNCIA DE UM ESFORÇO DIFERENCIAL QUE EXCEDA A RESISTÊNCIA DA ROCHA.

A resistência da rocha depende da pressão con­finante, ou seja, da profundidade de soterramento. Na porção superior e rúptil da crosta, a resistên­cia é menor perto da superfície e aumenta con­forme a profundidade. Isso pode ser facilmente de­monstrado em experimentos como o mostrado na Fig. 7.8, em que tanto a pressão confinante como o esforço direcional axial são variados. Com base nessa figura, podemos constatar que:

O AUMENTO DA PRESSÃO CONFINANTE EXIGE UM AU­MENTO DO ESFORÇO DIFERENCIAL PARA QUE OCORRA O FRATURAMENTO DE UMA ROCHA.



Resumo

A deformação rúptil tende a ser extremamente localizada e resulta em estruturas que enfraqueceram a crosta de modo significativo. A separação de diferentes tipos de estruturas rúpteis é importante, pois elas refletem o estado de esforços e de deformação durante a sua formação. Além disso, os diferentes tipos de fraturas afetam as rochas de modos diferentes em relação às suas propriedades mecânicas, potencial de reativação e permeabilidade. Esse tipo de estudo tem aplicações nas áreas de Engenharia, Sismologia, Hidrogeologia e Geologia de Petróleo. A formação de fraturas e de bandas de deformação é essencial para a formação e o crescimento de falhas, tema do próximo capítulo. Há vários pontos importantes deste capítulo que devem ser lembrados:
•        As fraturas se formam principalmente no regime rúptil, dominado pela mecânica rúptil.
•        Os mecanismos de deformação rúptil são a catáclase (fratura de grãos), a rotação rígida de grãos e a translação por deslizamento friccionaI nas bordas de grãos (reorganização de grãos).
•        Fraturas extensionais, tais como juntas, podem expandir-se e tornar-se estruturas extensionais, ao passo que as fraturas de cisalhamento não podem se expandir, a menos que pequenas fraturas extensionais se formem à frente da extremidade da fratura de cisalhamento e enfraqueçam a rocha. Nesse caso, as fraturas de cisalha­mento podem expandir-se pela coalescência de micro fraturas de extensão.
•        Os esforços concentram-se nas extremidades de fraturas, tanto grandes como pequenas, favorecendo o seu crescimento.
•        A alta pressão de fluidos em fraturas e poros também pode facilitar o fraturamento e a propagação de fraturas. As fraturas extensionais formam-se na direção perpendicular a σ3.
•        As fraturas de cisalhamento formam-se tipicamente em ângulos de 20° a 30° com σ1.
•        Um critério de fraturamento relaciona os esforços normal e de cisalhamento necessários para fraturar uma rocha, ou seja, os esforços críticos normal e de cisalhamento. O critério de Coulomb é linear, com razão constante entre os esforços críticos normal e de cisalhamento, sendo, portanto, representado por uma linha reta no espaço de Mohr.
•        A resistência de rochas não deformadas, medida experimentalmente, não é representativa da crosta rúptil, pois esta contém inúmeras estruturas de fraqueza, como falhas e fraturas.
•        O potencial de reativação de uma fratura depende de sua resistência friccionaI (de atrito), da pressão de fluidos no interior da fratura e da orientação relativa dos esforços principais. Estes também determinam o modo de reativação (extensão ou cisalhamento).


•        Tanto as fraturas como as bandas de deformação são importantes para a permeabilidade das rochas deformadas, mas geralmente têm efeitos opostos: as fraturas aumentam a porosidade e as bandas de deformação reduzem-na. 

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