Quebra Pedras

BLOG DEDICADO A ALUNOS DE GEOLOGIA

quinta-feira, 23 de outubro de 2014

DOBRAS E DOBRAMENTOS EM ROCHA

As dobras são estruturas visualmente atrativas e que podem formar-se em prati­camente qualquer tipo de rocha, contexto tectônico e profundidade. Por tais motivos, elas são conhecidas, admiradas e analisadas desde muito antes de a Geologia tornar-se uma ciência (Leonardo da Vinci analisou dobras há cerca de 500 anos, e Nicholas Steno, em 1669). Nossa compreensão sobre o que são dobras e dobramento mudou com o passar do tempo. Os fundamentos do que podemos considerar a teoria moderna das dobras consolidou-se nas décadas de 1950 e 1960. As dobras, sejam observadas em micro, mesa ou macroescala, são nossa janela mais importante para a história local e regional de deformação no passado. Suas formas trazem importantes informações sobre o tipo de deformação, a cinemática e a tectônica de uma área. Além disso, elas podem ter uma grande importância econômica, tanto como armadilhas para petróleo como na explotação de minérios e outros recursos minerais. Neste capítulo, iremos inicialmente abordar os aspectos geométricos das dobras e, a partir daí, discutir os processos e mecanismos ativos durante o dobramento.

11.1 Descrição geométrica

É fascinante observar a formação e o desenvolvi­mento das dobras em laboratório; podemos apren­der muito sobre dobras e dobramento por meio de experimentos em condições físicas controladas e simulações numéricas. A modelagem deve sempre ser baseada na observação de rochas naturalmente dobradas e, portanto, é fundamental a análise ge­ométrica de dobras formadas em diferentes ambi­entes e tipos de rocha. A análise geométrica é im­portante não apenas para a compreensão de como os vários tipos de dobras se formam, mas também na avaliação de armadilhas para hidrocarbonetos e corpos de minério dobrados. Há uma grande quan­tidade de expressões descritivas em uso, pois as do­bras existem em todas as formas e tamanhos. As­sim sendo, iremos apresentar, neste capítulo, o jar­gão básico relacionado às dobras e à sua geometria.

11.1.1 Forma e orientação

As dobras são mais bem estudadas em seção per­pendicular às camadas dobradas, ou seja, perpen­dicular à superfície axial (Fig. 11.1). Vamos consi­derar esta seção específica nas descrições ao longo de todo este capítulo, a menos que outra situação seja explicitamente indicada. Em geral, as dobras são formadas por uma charneira que liga dois flan­cos com orientações distintas. A charneira pode ser aguda e nítida, mas, geralmente, sua curvatura é gradual, definindo uma zona de charneira. Há uma grande variedade de dobras, desde as angulosas como as kink bands e as dobras em chevron (dobras angulosas), até as charneiras arredondadas das do­bras concêntricas (Fig. 11.2). A classificação das do­bras em relação à curvatura da charneira é também denominada angularidade (bluntness).

A forma das dobras também pode ser com­parada com funções matemáticas, caso em que podemos aplicar os conceitos de amplitude e comprimento de onda. As dobras não necessaria­mente têm a regularidade das funções matemáti­cas que aprendemos nas aulas de álgebra elemen­tar. Mesmo assim, a análise harmônica simples (transformada de Fourier) tem sido aplicada na descrição da forma de dobras, em que a função ma­temática é ajustada à superfície dobrada. A forma da transformada de Fourier usada pelos geólogos nesse caso, é:
f(x) = b1 senx + b3sen3x + bssen5x... (11.1)

Esta série converge rapidamente e, portanto, e suficiente considerar apenas os primeiros coeficien­tes, b1 e b3, na descrição das dobras naturais. Com base nesse método, Peter Hudleston propôs um sis­tema de classificação visual de dobras (Fig. 11.3).



Em rochas compostas por múltiplas camadas, as dobras podem repetir-se com forma similar na direção do traço axial (Fig. 11.2A-C). Essas dobras são denominadas harmônicas. Se as dobras diferirem em comprimento de onda ou forma ao longo do traço axial, ou se desaparecerem nessa direção, elas são consideradas dobras desarmônicas.

O ponto de máxima curvatura em uma camada dobrada, localizado no centro da zona de charneira é denominado ponto de charneira (Fig. 11.1). Os pontos de charneira conectam-se para formar uma linha de charneira, que é, em geral, curva, mas quando aparece como uma linha reta é denomi­nada eixo de dobra.

Isso nos leva a um importante elemento da ge­ometria de dobras: a cilindricidade. Dobras com li­nhas de charneira retilíneas são dobras cilíndricas. Uma dobra cilíndrica pode ser vista como um ci­lindro parcialmente aberto, onde o eixo do cilindro define o eixo da dobra (Fig. 11.4A). Dependendo da escala de observação, todas as dobras são não cilín­dricas, pois devem começar e terminar em algum lugar, ou transferir deformação para as dobras vizi­nhas (Boxe 11.1), mas o grau de cilindricidade varia de uma dobra para outra. Portanto, parte de uma dobra pode parecer cilíndrica quando vista em afloramento (Fig. 11.5), mesmo que seu eixo deva estar curvado em uma escala mais ampla.

A cilindricidade tem importantes implicações. A mais relevante delas é que os polos de uma camada com uma dobra cilíndrica definem um grande círculo, cujo polo (eixo π) representa o eixo da dobra (Fig. 11.6A). Quando um diagrama é construído com grandes círculos em vez de polos, os grandes cír­culos de uma camada com uma dobra cilíndrica irão intersectar-se em um ponto comum que repre­senta o eixo da dobra, nesse caso denominado eixo  β (Fig. 11.6B). Esse método pode ser muito útil no mapeamento de dobras em campo, bem como na análise de outras estruturas cilíndricas, como as superfícies onduladas de falhas.

Outra propriedade conveniente das dobras cilín­dricas é a possibilidade de projetá-las linearmente, por exemplo, de um plano para um perfil. Consideramos a cilindricidade ao projetarmos as estru­turas mapeadas em um perfil geológico; esse méto­do foi amplamente utilizado no início do século XX, nos mapeamentos dos Alpes Suíços, por geólo­gos como Emile Argand e Albert Heim. Como a validade dessas projeções se baseia na cilindricidade verdadeira das estruturas projetadas, a incerteza  aumenta com a distância da projeção.

superfície axial ou plano axial, se for perfei­tamente plana, conecta as linhas de charneira de duas ou mais superfícies dobradas. O traço axial de uma dobra é a linha de intersecção da superfície axial com a superfície de observação em aflo­ramento ou em uma seção geológica. O traço axial conecta pontos de charneira nessa superfície. Note que a superfície axial não necessariamente bissecta os flancos (Fig. 11.2A). Também é possível haver dois conjuntos de superfícies axiais, que é o caso nas dobras em caixa, também chamadas de dobras conjugadas, em razão dos seus conjuntos conjuga­dos de superfícies axiais (Fig. 11.2D). As dobras com superfícies axiais de atitudes variáveis são denomi­nadas dobras policlinais.

A atitude de uma dobra é descrita pela atitude de sua superfície axial e de sua linha de charneira. Esses dois parâmetros podem ser lançados em um diagrama de classificação de dobras (Fig. 11.7). Os termos mais comumente usados são dobras nor­mais (plano axial vertical e linha de charneira ho­rizontal) e dobras recumbentes (plano axial e linha de charneira horizontais).

A maioria das dobras da Fig. 11.7 são dobras antiformais. Uma antiforma é uma estrutura cujos flancos mergulham e se afastam da zona de char­neira, que é o oposto de uma sinforma, que tem a forma de um canal (Fig. 11.8BC). Quando a sequên­cia estratigráfica é conhecida, uma antiforma é de­nominada anticlinal se as rochas forem progressi­vamente mais jovens ao afastarem-se da superfície axial da dobra (Figs. 11.8E e 1.6). De modo análogo, uma sinclinal é uma dobra em forma de canal, cu­jas camadas são progressivamente mais jovens em direção à superfície axial (Fig. 11.8D). As sinformas e antiformas podem ser tanto normais como incli­nadas (Fig. 11.7). Podemos até encontrar sinclinais e anticlinais recumbentes, porque suas definições se baseiam na estratigrafia e na idade relativa das camadas. Entretanto, os termos sinforma e antiforma recumbente ou vertical não fazem sentido.

Imagine uma dobra cerrada à isoclinal que te­nha sido redobrada em uma fase tectônica tardia. Isso faz com que apareçam sinformas e antiformas secundárias. A direção estratigráfica que aponta para a camada mais jovem em relação à superfície axial irá depender se estamos no flanco normal ou invertido da dobra recumbente (Fig. 11.8H). Neces­sitamos de mais dois nomes para distinguir estes casos; anticlinal sinformal e sinclinal antiformal (Fig. 11.8F,G). Uma dobra anticlinal sinformal é uma anticlinal porque as camadas se tornam mais jovens ao afastarem-se da superfície axial; ao mesmo tempo, ela tem a forma de uma sinforma, ou seja, sinformal. Do mesmo modo, uma dobra sinclinal antiformal é sinclinal por causa das relações estra­tigráficas, mas tem a forma de uma antiforma. Tecnicamente, uma anticlinal sinformal corresponde a uma anticlinal na posição invertida, e uma sinclinal antiformal é uma sinclinal invertida. Confuso? Lem­bre-se de que esses termos apenas se aplicam no mapeamento de sequências de camadas afetadas por múltiplos dobramentos, tipicamente em cinturões orogênicos.







Além da atitude e das relações estratigráficas, as dobras são comumente descritas em relação ao ângulo interflancos, que é o ângulo interno entre os dois flancos. Com base nesse ângulo, as dobras podem ser divididas em suaves, abertas, cerradas e isoclinais (Fig. 11.9). O ângulo interflancos geralmente reflete a quantidade de deformação durante o dobramento.


Como mencionado, a maioria das dobras são não cilíndricas em algum grau. Uma antiforma nor­mal não cilíndrica é, por vezes, denominada dobra com duplo caimento. Grandes antiformas com duplo caimento podem formar importantes armadi­lhas para petróleo e gás; de fato, elas representam algumas das maiores armadilhas para hidrocarbonetos. Quando a não cilindricidade é significativa, a antiforma torna-se um domo, que é similar a uma tigela invertida (ou um molde oco do Yosemite's Half Dome). Os domos são armadilhas clássicas de hidrocarbonetos, por exemplo, acima de estruturas salinas; alguns geólogos se referem a essas estrut­uras como fechamento por mergulho em quatro direções (four-way dip closure). Por outro lado, na terminologia das dobras, uma sinforma fortemente não cilíndrica é uma bacia (uma tigela em posição normal).



Dobra monoclinal é uma dobra subcilíndrica com apenas um flanco inclinado (Fig. 11.8A). As dobras monoclinais (ou apenas monoclinas) são, em geral, estruturas mapeáveis relacionadas à reativação (ou compactação diferencial) de falhas subjacentes ou de estruturas de sal (Fig. 1.6).

As dobras tendem a ocorrer em grupos ou siste­mas e, apesar de elas não serem muito sistemáticas, dobras vizinhas tendem a apresentar estilos em co­mum, especialmente quando ocorrem em sequên­cias ou "comboios". Nesses casos, elas podem ser descritas em termos de comprimento de onda, amplitude, ponto de inflexão e por uma superfície de referência denominada superfície envoltória.  Trata-se da superfície que tange os flancos individuais ao longo de uma camada dobrada (Fig. 11.1) Note que a superfície envoltória não conecta necessariamente a linhas de charneira, apesar de que isto possa ocorrer em dobras simétricas.

11.1.2 Isógonas de mergulho

Em alguns tipos de dobras, as camadas preservam suas espessuras, enquanto outros tipos apresentam espessamento de flancos ou charneira. Estas e outras feições relacionadas foram analisadas pelo geólogo inglês John Ramsay, que classificou as dobras geometricamente por meio de isógonas de mergulho. Ao orientarmos uma dobra de modo que seu traço axial se torne vertical, isolinhas ou isógo­nas de mergulho podem ser traçadas entre pontos de igual mergulho nas superfícies interna e externa de uma camada dobrada. As isógonas de mergulho retratam a diferença entre as duas superfícies (in­terna e externa) e, portanto, as mudanças na espes­sura da camada. Com base nas isógonas de mer­gulho, as dobras podem ser classificadas em três classes principais (Fig. 11.10):


Classe 1: as isógonas de mergulho convergem para o arco interno, que é mais fechado que o arco externo.
Classe 2 (dobras similares ou dobras de cisalha­mento): as isógonas de mergulho são paralelas ao traço axial. As formas dos arcos interno e externo são idênticas.
Classe 3: as isógonas de mergulho divergem em direção ao arco interno, que é mais aberto que o arco externo.

As dobras de classe 1 são subdivididas em 1A 1B e 1C. As dobras 1A são caracterizadas por zo­nas de charneira adelgaçadas, enquanto as dobras 1B têm espessura de camada constante e são tam­bém denominadas dobras paralelas ou, se tiverem forma circular, dobras concêntricas (Fig. 11.2C). Do­bras de classe lC apresentam flancos ligeiramente adelgaçados. As dobras de classe 2 e, em especial, de classe 3 apresentam flancos ainda mais adelga­çados e charneiras espessadas. Dentre essas clas­ses, as formas das classes 1B (paralelas) e 2 (simi­lares) se destacam por serem mais comuns e mais fáceis de identificar em campo.

No diagrama de classificação baseado nas isógonas de mergulho (Fig. 11.11), as dobras são consideradas estruturas normais (plano axial vertical), de modo que o mergulho do flanco (a) aumente para os dois lados a partir de 0° no ponto de charneira. O parâmetro vertical no diagrama, t’α é a versão normalizada da espessura ortogonal, que é indicada por tα na Fig. 11.11. Esta é a espessura ortogonal da camada medida em um dos dois pontos correspondentes de igual mergulho em cada arco (pontos vermelhos na Fig. 11.11). Para as dobras da classe lB, t’α, independentemente da posição na camada dobrada, e cada flanco da dobra estará situado no diagrama sobre a linha horizontal t’α = 1. Dessa forma, lançando as medidas de uma única camada dobrada, obteremos uma série de pontos que definem duas linhas (uma para cada lado do ponto de charneira) na Fig. 11.11.
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Boxe 11.1 ESTRUTURAS DE DOBRAS SOBREPOSTAS
As dobras individuais podem sobrepor-se e interferir urnas nas outras. Assim corno as falhas, elas iniciam-se como pequenas estruturas e interagem pela formação de estruturas de sobreposição ou de transferência. Estruturas de dobras sobrepostas foram mapeadas pela primeira vez em cinturões de dobramento e cavalgamento, particularmente nas Montanhas Rochosas do Canadá. Muitos dos princípios fundamentais das estruturas de dobras sobrepostas vieram do estudo das populações de dobras. As sobreposições de dobras são zonas onde a deformação é transferida de urna dobra para outra. Mudanças bruscas na am­plitude das dobras são características de estruturas de dobras sobrepostas.
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11.3 Simetria e ordem

As dobras podem ser simétricas ou assimétricas em seção geológica. Uma dobra é perfeitamente simétricas se os dois lados do traço axial forem imagens um do outro, quando observados em seção geológica perpendicular à superfície axial. Isso significa que os dois flancos têm o mesmo comprimento. As dobras em chevron e as concêntricas (Fig. 11.2) são exemplos de dobras simétricas.



Se estendermos esse conceito para as três dimensões, o plano axial torna-se um plano de simetria (especular), e as dobras mais simétricas possíveis terão outros dois planos de simetria perpendiculares ao plano axial. Esta são características da simetria ortorrômbica. Nas dobras simétricas, o plano bissetriz coincide com o plano axial. Portanto, as kink bands (Fig. 11.2ª) não são simétricas. De fato, esta é a diferença entre kink bands e dobras em chevron: estas são simétricas, enquanto aquelas têm um flanco curto e outro longo. Isso nos deixa com apenas um plano de simetria: o perpendicular à superfície axial, e a simetria passa a ser monoclínica.

As dobras simétricas geralmente são denomina· das dobras em M, e as dobras assimétricas são de­nominadas dobras em S ou dobras em Z (Fig. 11.12 A distinção entre dobras em S e em Z pode causa: certa confusão, mas as dobras em Z têm flancos curtos que parecem ter sido rotacionados no sen­tido horário em relação aos flancos longos. Elas imi­tam, portanto, a letra Z, quando consideramos o flanco curto e os dois flancos longos adjacentes. As dobras em S implicam rotação no sentido anti-ho­rário e assemelham-se à letra S (não há nenhuma relação entre as dobras e a angularidade das letras S e Z). É interessante notar que as dobras em S transformam-se em dobras em Z quando vistas da direção oposta. Dobras com caimento são, em gera. analisadas em observação na direção do caimento (plunge), e a direção de observação deve ser indicada no caso das dobras com eixos horizontais.




Os sistemas de dobras com assimetria consis­tente apresentam uma vergência, a qual pode ser especificada, e a direção de vergência é dada pelo sentido de deslocamento do flanco superior em relação ao flanco inferior (Fig. 11.13). Podemos também relacioná-la à rotação no sentido horário do flanco curto inclinado na Fig. 11.13, em que uma rotação horária implica vergência para a direita.



A vergência de dobras é importante na análise estrutural por diversos motivos. As dobras grandes geralmente apresentam dobras menores em seus flancos e zonas de charneira (Fig. 11.12). As dobras maiores são chamadas de dobras de primeira or­dem, e as dobras menores associadas são de se­gunda ordem ou de ordens mais elevadas. Essas dobras menores são denominadas dobras parasitas. As dobras de primeira ordem podem ser de qual­quer tamanho, mas quando são visíveis em escala de mapa, é provável que apenas as dobras de se­gunda ordem e de ordens mais elevadas sejam visí­veis em afloramento. Se um sistema de dobras cor­responde a dobras parasitas (de segunda ordem) de uma estrutura sinformal ou antiformal de primeira ordem, sua assimetria e sua vergência indicam sua posição na estrutura de larga escala. As dobras pa­rasitas têm vergência direcionada para a zona de charneira (Fig. 11.12). A relação entre dobras parasi­tas e dobras de ordens mais baixas pode ser extre­mamente útil no mapeamento de estruturas dobra­das que são grandes demais para serem vistas em afloramentos individuais.



A vergência de sistemas assimétricos de dobras em zonas de cisalhamento não está, em geral, re­lacionada a dobras de ordem mais baixa, e pode dar informações sobre o sentido de cisalhamento da respectiva zona. Essa análise cinemática requer que a seção observada contenha o vetor de cisalha­mento e que este possa ser usado juntamente com outros indicadores cinemáticos independentes (ver Cap.15).




A (as)simetria de dobras pode também refletir a deformação e a orientação do elipsóide de de­formação. Em geral, as camadas paralelas a ISA3 (direção de encurtamento mais rápido, ver Cap. 2) irão desenvolver dobras simétricas. Na deformação coaxial, essa relação é direta (Fig. 11.14), mas em cisalhamento simples e outros tipos de deformação não coaxial, a situação é mais complexa, pois as camadas são rotacionadas através da posição de ISA3 durante a deformação.



A ASSIMETRIA DE DOBRAS PODE SER RELACIONADA À POSIÇÃO DA DOBRA EM UMA DOBRA DE ORDEM MAIS BAIXA, AO SENTIDO E À ORIENTAÇÃO DO CISALHAMENTO DA CAMADA DOBRADA EM RELAÇÃO À ELIPSE DE DEFORMAÇÃO.

Extraído de: FOSSEN, Haakon. Geologia Estrutural; trad. Fábio R. D. Andrade. Cap. 11: Dobras e dobramento. São Paulo : Oficina de Textos, 2012. 

quinta-feira, 16 de outubro de 2014

ELEMENTOS DE DOBRA EM ROCHA

Uma dobra é o resultado da transformação de uma superfície de referência, geralmente plana, numa superfície curva, geralmente em conseqüência de esforços tectônicos.

Os elementos da dobra



Observando o perfil de uma dobra, podemos notar que ele apresenta um ponto de maior curvatura (ou de menor raio de curvatura): é a charneira. Em certos casos, em vez de pontos de maior curvatura, a curvatura é máxima e constante numa determinada porção do perfil. Neste caso, teremos uma zona de charneira.

Considerando o perfil de um plano dobrado como uma onda, é possível definir o comprimento de onda e a amplitude da dobra. Geralmente, a amplitude e o comprimento de ondas são definidos apenas como milimétricos, centimétricos etc.




É possível mostrar experimentalmente que o comprimento de onda das dobras é uma função, entre outros parâmetros, da espessura das camadas, conforme a figura abaixo.



Quando todas as dobras de um pacote rochoso apresentam o mesmo comprimento de onda, o dobramento é harmônico. Caso contrário, é desarmônico (figura abaixo).



Quando um conjunto dobrado apresenta duas escalas (ou duas ordens) de dobramento, uma amplitude maior (1ª ordem) e uma amplitude menor (2ª ordem) que redobra as camadas deformadas em maior escala, a superfície tangente às dobras menores e que materializa as dobras maiores é a envoltória.


No intervalo entre duas charneiras sucessívas, a curvatura da dobra sofre uma inversão. O ponto de inversão é um ponto de inflexão e o ângulo entre as tangentes á dobra em dois pontos de inflexão consecutiva é a abertura.



A linha que une, num perfil, os pontos de inflexão dos flancos consecutivos é a linha mediana.
Os pontos mais elevados e mais baixos, na topografia, de uma dobra são, respectivamente, a crista e a calha (ou quilha). Eles podem ou não corresponder às charneiras da dobra.

A s dobras que admitem o bissetor da abertura com o plano de simetria são simétricas. Quando isto não é o caso, as dobras são assimétricas, conforme se pode observar na figura abaixo.



Em outras palavras, na dobra simétrica o plano axial  é essencialmente vertical e o ângulo de mergulho dos dois flancos é igual; na dobra assimétrica o plano axial pode ser ou não inclinado e o ângulo de mergulho dos dois flancos difere um do outro.



É possível caracterizar, em função do seu aspecto, as dobras assimétricas como dobras S e dobras Z (figura abaixo).



A assimetria global do pacote dobrado é caracterizada pela vergência, que é a direção para a qual as dobras se inclinam. No caso da figura abaixo, a vergência é para leste.




Dobras cuja superfície pode ser gerada pela translação de uma reta são dobras cilíndricas. Quando são geradas pela translação de uma curva, são curviplanares. Nos demais casos, as dobras são quaisquer. As dobras cônicas possuem linha de charneira,  mas não possuem eixo de dobra e se dispõem como parte de um cone.



O conjunto das charneiras forma o eixo da dobra (quando, em vez de charneira, a dobra apresenta uma zona de charneira, é possível definir uma zona axial). A porção da dobra compreendida entre dois eixos sucessivos é o flanco da dobra. O conjunto de todos os pontos de inflexão de um flanco é a linha de inflexão. Os conjuntos das cristas e das calhas (ou quilhas) formam a linha de crista e a linha de calha (chamados às vezes de crista e calha).



Considerando um empilhamento de camadas dobradas, é possível definir, para cada uma, um eixo. O conjunto desses eixos é a superfície axial (ou plano axial) da dobra (figura abaixo). 


Nem sempre esse plano é bissetor da abertura da dobra (figura abaixo).



A superfície dobrada pode apresentar vários graus de simetria. Quando ela admite dois planos de simetria, a dobra é ortorrômbica; quando admite apenas um plano de simetria, é monoclínica; quando não admite nenhum plano de simetria, ela é triclínica.



Resumo:

·       Charneira: onde a dobra atinge sua máxima curvatura.
·       Linha de charneira: união dos diversos pontos de charneira.
·       Zona de charneira: parte da dobra próxima à charneira.
·      Crista: ponto mais alto da dobra em relação a uma superfície horizontal (linha de crista: união dos pontos de crista).
·       Calha: ponto mais baixo de uma dobra em relação a uma superfície horizontal.
·   Eixo: linha geratriz da dobra, quando movimentada paralelamente à linha de charneira, no espaço de si mesma.
·       Plano da dobra ou superfície axial: a superfície que une os pontos de charneira da dobra.
·   Ponto de inflexão: local onde o flanco muda sua inflexão (de côncavo para convexo e viceversa).
·       Linha de inflexão: linha que une os pontos de inflexão.
·     Flancos ou limbos: partes que se situam entre duas charneiras adjacentes e que contêm os pontos de inflexão.

Este texto foi extraído de:

ALMEIDA, Júlio. Geologia Estrutural: Dobras. UERJ.

ARTHAUD, Michel H. Elementos de Geologia Estrutural. Fortaleza, 1998.

sexta-feira, 3 de outubro de 2014

FALHAS E ROCHAS DE FALHA

Apresentamos dois textos que explanam nossa aula sobre falhas e rochas de falhas.

Texto 1: Extraído de FOSSEN, Haakon. Geologia Estrutural. Trad. Fábio R. D. de Andrade. Capítulo 8 – Falhas. São Paulo : Oficina de Textos, 2012.


As falhas afetam as camadas de rochas e introduzem "defeitos" no arcabouço estratigráfico primário. Elas são estruturas geológicas extremamente intrigantes e fascinantes para os que trabalham com Geologia Estrutural, ainda que em alguns casos possam frustrar estratígrafos e mineradores por dificultarem o mapeamento geológico e a interpretação de dados sísmicos. Hoje sabemos mais sobre as falhas do que há poucas décadas, em razão principalmente dos avanços da indústria do petróleo. Elas também representam desafios para a disposição de resíduos e para a construção de túneis. As falhas ativas têm uma relação próxima com terremotos e desastres sísmicos. Neste capítulo, abordaremos a geometria, a anatomia e a evolução de falhas e de conjuntos de falhas, com exemplos e aplicações relevantes para a indústria do petróleo.

8.1 Terminologia de falhas

Enquanto as fraturas e outras descontinuidades abordadas nos capítulos anteriores são estruturas relativamente simples, as falhas são muito mais complexas e podem acomodar grande quantidade de deformação na crosta superior. O termo falha é usado de diferentes modos, dependendo do con­texto. Uma definição simples e tradicional seria:

UMA FALHA É QUALQUER SUPERFÍCIE OU FAIXA ESTREITA ONDE É VISÍVEL UM DESLOCAMENTO CAUSADO POR CISA­LHAMENTO.

Esta definição é praticamente idêntica à de fra­tura de cisalhamento, e alguns geólogos usam os dois termos como sinônimos. Alguns geólogos refe­rem-se às fraturas de cisalhamento com rejeitos mi­limétricos ou centimétricos como microfalhas. En­tretanto, há uma tendência para restringir-se o uso do termo fratura de cisalhamento às estruturas de pe­queno porte e de aplicar-se o termo falha às estrutu­ras mais bem desenvolvidas, com rejeitos da ordem de 1 m ou mais.

A espessura de uma falha é outro aspecto rele­vante. As falhas são, em geral, expressas como pla­nos ou superfícies, tanto na linguagem oral como na escrita, mas um exame minucioso revela que elas formam uma faixa com uma espessura men­surável e com estruturas rúpteis subsidiárias. A es­pessura é, em geral, muito menor que o rejeito, e muitas ordens de grandeza menor que o compri­mento da falha. Uma falha pode ser considerada como uma superfície ou como uma faixa, depen­dendo da escala de observação, dos objetivos e do grau de precisão necessário.

As falhas tendem a formar zonas complexas de deformação, com múltiplos planos de cisalha­mento, fraturas subsidiárias e, em alguns casos, bandas de deformação. Isso é particularmente visí­vel quando consideramos grandes falhas, com rejei­tas de porte quilométrico. Elas podem ser conside­radas falhas simples em um mapa ou em um perfil sísmico, mas poderão ser descritas em campo como um conjunto de planos de falha. Em outras pala­vras, a dependência da escala é fundamental para o geólogo estruturalista. Isso levou a maioria dos geólogos a considerar as falhas como um volume de rochas deformadas de modo rúptil, volume este que é relativamente delgado em uma direção:

UMA FALHA É UM VOLUME TABULAR DE ROCHA COM UMA SUPERFÍCIE CENTRAL OU NÚCLEO DE CISALHAMENTO, ONDE O CISALHAMENTO É MAIS INTENSO, ENVOLTO POR UM VOLUME AFETADO EM MENOR GRAU POR UMA DEFOR­MAÇÃO RÚPTIL, QUE TEM RELAÇÃO ESPACIAL E GENÉTICA COM A FALHA.

O termo falha pode ainda ser aplicado a mecanis­mos de deformação (rúptil ou plástica). De modo in­formal, esse termo cobre tanto as descontinuidades rúpteis como as zonas de cisalhamento dúctil, do­minadas pela deformação plástica. Isso está implí­cito quando discutimos grandes falhas que atraves­sam grandes porções da crosta em perfis sísmicos ou geológicos. O termo falha rúptil (em oposição à zona de cisalhamento rúptil) pode ser usado em casos em que é importante indicar o mecanismo de deformação. Na maioria dos casos, os geólogos implicitamente restringem o termo falha a desliza­mentos ou descontinuidades causados por cisalha­mento dominado por mecanismos de deformação rúptil, o que faz com que o termo falha rúptil seja algo redundante:

UMA FALHA É UMA DESCONTINUIDADE COM DESLOCA­MENTO PARALELO ÀS SUAS PAREDES E DOMINADA POR MECANISMOS DE DEFORMAÇÃO RÚPTIL.



As descontinuidades, nesse contexto, referem­-se principalmente às camadas de rochas, ou seja, as falhas cortam as camadas de rochas, que se tor­nam descontínuas. Entretanto, as falhas também representam descontinuidades mecânicas e de des­locamento. A Fig. 8.1 ilustra como o campo de des­locamento varia rapidamente através das falhas,  tanto em mapa como em perfil. Uma definição cinemática, particularmente útil para trabalhos experimentais e monitoramento de falhas ativas por GPS, pode ser acrescentada:

UMA FALHA É UMA DESCONTINUIDADE NA VELOCIDADE OU NO CAMPO DE DESLOCAMENTO ASSOCIADOS À DEFORMAÇÃO.

Como mencionado no capítulo anterior, as falhas são diferentes das fraturas de cisalhamento, porque uma simples fratura de cisalhamento não pode expandir-se ao longo do seu próprio plano para tornar-se uma grande estrutura. As falhas, por sua vez, podem crescer pela criação de uma complexa zona de processos, com numerosas pequenas fraturas, sendo que algumas delas se conectam para formar as superfícies de deslocamento, enquanto que outras são abandonadas.

8.1.1 Geometria das falhas

As falhas não verticais separam o bloco superior, denominado capa ou teto, do bloco inferior, chamado lapa ou muro (Fig. 8.2). Quando a capa é rebaixada em relação à lapa, há uma falha normal. No caso oposto, onde a capa é soerguida em relação à lapa, há uma falha reversa. Se o movimento for lateral, ou seja, no sentido do plano horizontal, temos uma falha transcorrente. As falhas transcorrentes podem ter rejeito sinistral (lateral esquerdo) ou destral (lateral direito) (do latim sinister = esquerda, dexter = direita).

Observa-se uma ampla gama de ângulos de mergulho dos planos de falhas, desde verticais até horizontais, mas alguns deles são mais comuns: as falhas transcorrentes têm ângulo de mergulho alto, e as falhas reversas possuem, tipicamente, ângulo de mergulho menor que o das falhas normais. Se o ângulo de mergulho for menor que 30°, a falha é denominada falha de baixo ângulo, ao passo que as falhas de alto ângulo têm mergulho maior que 60°. As falhas reversas de baixo ângulo são denomi­nadas falhas de cavalgamento, especialmente se o movimento dos blocos for da ordem de dezenas ou centenas de quilômetros.

Uma falha que se horizontaliza com o aumento da profundidade é uma falha lístrica (Fig. 8.3), en­quanto as falhas cujo ângulo de mergulho aumenta com a profundidade são, por vezes, denominadas antilístricas. Os termos rampa e patamar, original­mente ligados à terminologia das falhas de cavalga­mento, são usados para descrever a alternância de porções inclinadas e sub-horizontais em qualquer plano de falha. Por exemplo, uma falha que varia de inclinada para horizontal e novamente para incli­nada tem uma geometria rampa-patamar-rampa.




As irregularidades são particularmente comuns em seções perpendiculares à direção de desloca­mento da falha. Nas falhas normais e reversas, isso significa traços de falha curvos quando vistos em mapas, como nas falhas em campos de petróleo ex­tensionais (Fig. 8.4). As irregularidades nessa seção não causam conflito durante o deslizamento dos blocos, contanto que os eixos das irregularidades coincidam com o vetor de deslizamento. Quando as irregularidades também ocorrem na direção de deslocamento, pode haver deformação na capa e/ou na lapa. Por exemplo, uma falha normal lístrica cria tipicamente estruturas antiformes (rollover) na capa.

UMA FALHA PODE TER QUALQUER FORMA PERPENDICULAR À DIREÇÃO DE DESLIZAMENTO, MAS FORMAS NÃO LINEA­RES NA DIREÇÃO DE DESLIZAMENTO GERAM PROBLEMAS DE ESPAÇO E DEFORMAÇÃO DA CAPA E/OU LAPA.

O termo zona de falha refere-se tradicional­mente a uma série de falhas ou superfícies de deslizamento subparalelas, suficientemente pró­ximas umas das outras para definir uma zona. A largura da zona depende da escala de observação ­em campo ela varia de centímetros a metros, mas pode ser da ordem de quilômetros ou mais quando estudamos falhas de grande porte, como a Falha de San Andreas (EUA). Pode haver algumas incon­sistências quanto ao uso do termo zona de falha, particularmente em relação à parte central da falha, onde todas ou a maioria das estruturas originais da rocha são obliteradas, ou quanto ao núcleo e às zonas marginais de deformação associadas à falha. Essa situação, comum na literatura relacionada à Geologia de Petróleo, pode causar alguma confusão e, portanto, o uso do termo zona de falha requer uma especificação cuidadosa.

Duas falhas normais separadas que mergulham uma em direção à outra criam um bloco rebaixado denominado graben (Fig. 8.5). As falhas normais com mergulhos em direções opostas criam um bloco soerguido denominado horst. As falhas mai­ores em regiões falhadas são denominadas falhas mestras (master faults) e estão associadas a falhas menores, que podem ser sintéticas ou antitéticas. Uma falha antitética mergulha na direção da falha mestra, enquanto uma falha sintética mergulha na mesma direção da falha mestra (Fig. 8.5). Essas expressões são relativas e apenas fazem sentido quando as falhas menores estão relacionadas a falhas maiores específicas.



8.1.2 Rejeito, escorregamento e separação

O vetor que conecta dois pontos que foram contí­guos antes do falhamento chama-se vetor de deslo­camento (rejeito) local ou direção de rejeito líquido (Fig. 8.6). Idealmente, uma falha transcorrente tem um rejeito horizontal, enquanto as falhas normal e reversa têm vetores de deslocamento na direção do mergulho. Em geral, o rejeito total que observamos na maioria das falhas é a soma de vários incremen­tos (terremotos), cada um com seu próprio vetor de deslocamento ou de rejeito. Os rejeitos individuais podem ter direções distintas. Há, portanto, uma di­ferença entre a deformação sensu stricto, que relaci­ona apenas os estados deformado e não deformado, e a história da deformação. Podemos procurar em campo as evidências do histórico dos rejeitos em feições como estrias múltiplas.



Uma série de vetores de deslocamento sobre a superfície de deslocamento resulta em um campo de deslocamento ou campo de rejeito nessa super­fície. As estrias, os indicadores cinemáticos (Cap. 9) e o rejeito das camadas fornecem ao geólogo de campo informações sobre a direção, o sentido e a magnitude do rejeito. Muitas falhas apresentam desvios a partir dos rejeitos puros no sentido do mergulho ou no sentido da direção, ou seja, apre­sentam vetor de rejeito líquido oblíquo. Tais falhas são denominadas falhas de rejeito oblíquo (Fig. 8.7). O grau de inclinação é indicado pelo pitch (ou rake), que é o ângulo entre a direção da superfície de des­lizamento e o vetor de rejeito (estrias).

Se não soubermos qual é o verdadeiro vetor de deslocamento, podemos ser enganados pelo rejeito aparente de uma seção arbitrária em um maciço ro­choso falhado, seja ela sísmica ou em afloramento (Fig. 8.6B). O rejeito aparente observado em uma se­ção ou plano é denominado separação (aparente). O rejeito horizontal é a separação das camadas vista em uma exposição horizontal ou em um mapa (Fig. 8.6B), enquanto o rejeito de mergulho é ob­servado em uma seção vertical (Fig. 8.6C). Nesta, o rejeito de mergulho pode ser decomposto em um rejeito vertical e em um horizontal. Note que esse rejeito horizontal é diferente daquele mostrado na Fig. 8.6D. Esses dois rejeitos registrados em uma seção vertical podem ser denominados rejeito ho­rizontal aparente (heave) e rejeito vertical aparente (throw) (Fig. 8.6C). O rejeito verdadeiro ou total de uma falha pode ser observado apenas na seção que contenha o verdadeiro vetor de deslocamento (Fig. 8.6D).
Uma falha que afeta uma sequência de cama­das irá separar, nas três dimensões, cada superfí­cie (interface estratigráfica), e dessa forma surgirão duas linhas de corte de falha (Fig. 8.8). Se a falha não for vertical e o vetor de deslocamento não for paralelo ao acamamento, o mapa da superfície fa­lhada irá mostrar um espaço aberto entre duas li­nhas de corte. A largura do espaço aberto, que não apresentará contornos, está relacionada tanto ao mergulho da falha como ao seu rejeito de mergulho. Além disso, a abertura reflete o rejeito horizontal aparente visto na seção vertical através da falha (Fig.8.8).

8.1.3 Separação estratigráfica

A perfuração através de uma falha pode resultar em uma seção repetida ou em uma seção faltante no corte de falha (ponto onde a perfuração intersecta a falha). Em perfurações verticais, o caso é simples: falhas normais omitem camadas (Fig. 8.9A) e falhas reversas causam a repetição de camadas ao longo da perfuração. Em perfurações inclinadas, onde a inclinação do furo é menor que a do mergulho da fa­lha, como na perfuração G, na Fig. 8.9B, a repetição estratigráfica pode ser vista em falhas normais. O termo geral para a ausência ou a repetição de uma seção estratigráfica em poços perfurados através de uma falha é separação estratigráfica. A separação es­tratigráfica é uma medida do rejeito de falha obtida em perfurações de poços de petróleo, e será igual ao componente vertical de rejeito de falha se as ca­madas forem horizontais. A maioria das camadas falhadas não é horizontal, e o componente vertical de rejeito deve ser calculado.







8.2 Anatomia de falha

As falhas registradas em perfis geológicos ou sÍsmi­cos são, em geral, representadas por linhas simples de espessura constante. Em detalhe, entretanto, as falhas raramente são superfícies simples ou zonas de espessura constante. De fato, elas são, em sua maioria, estruturas complexas formadas por uma quantidade praticamente imprevisível de elemen­tos estruturais. Como há variações tanto ao longo como entre as falhas, não é fácil chegarmos a um modelo simples para descrever uma falha. Na maioria dos casos, é útil fazer uma distinção entre o núcleo da falha (ou superfície de deslizamento) e o volume ao seu redor, conhecido como zona de dano de falha, onde as rochas apresentam deformação rúptil (Fig. 8.10).




O núcleo da falha pode variar de uma simples su­perfície de deslizamento, com uma zona cataclás­tica de espessura milimétrica, a uma zona com vá­rias superfícies de deslizamento ou até zonas in­tensamente cisalhadas com vários metros de es­pessura, onde apenas resquícios da rocha original estão preservados. Em rochas cristalinas, o núcleo da falha pode ser constituído por um material pra­ticamente não coeso conhecido como gouge de fa­lha, no qual argilominerais são formados a partir de feldspatos e outros minerais primários. Em ou­tras situações, o núcleo da falha pode conter cataclasitos de alta dureza, particularmente em fa­lhas formadas na parte inferior da crosta superior rúptil. Vários tipos de brechas, coesas ou não co­esas, também são encontrados em núcleos de fa­lhas. Em casos extremos, a fricção faz com que as rochas cristalinas sejam localmente fundidas, cri­ando uma massa vítrea conhecida como pseudota­quilito. 

Texto 2: Rochas formadas nas zonas de falha.


A movimentação dos blocos no decorrer do falhamento pode provocar profundas alterações nos materiais afetados, levando à formação de uma categoria específica de rochas, as rochas cataclásticas, enquadradas no conjunto das rochas metamórficas (metamorfismo dinâmico).

Estas rochas se formam por evolução de um microfraturamento inicial. A coalescência das microfraturas provoca uma partição da rocha em blocos angulosos de tamanho variável. Com o adensamento da rede de fraturas, o tamanho dos blocos tende a diminuir. Esta diminuição pode ser acompanhada de um arredondamento progressivo dos elementos, induzido pela sua rotação em conseqüência da movimentação dos blocos de falha. Este processo de trituração, totalmente frágil, chamado cominuição ou cataclazação, leva à formação de rochas constituídas por uma matriz fina englobando fragmentos da rocha inicial.

As rochas formadas nessas condições podem ou não sofrer uma litificação, apresentando-se coesas ou não. Em função da intensidade da deformação, tanto a proporção fragmentos/matriz como o tamanho dos fragmentos varia.


No caso de falhas sísmicas (falhas ligadas à terremotos, acompanhadas de uma movimentação muito rápida), a energia liberada pelo atrito dos blocos pode ser suficiente para provocar uma fusão parcial limitada nas rochas encaixantes ao longo do plano de falha.



Brecha de Falha
Cataclasito:  frag de qz em matriz coesiva rica em epídoto
O material líquido assim formado, geralmente em volume pequeno, provoca um aumento de pressão que pode gerar um fraturamento hidráulico das encaixantes. Esse material é injetado nas fraturas assim formadas, onde ele resfria imediatamente, adquirindo uma textura vítrea. Por conta da sua semelhança com os taquilitos (vidros vulcânicos), esta rochas são chamadas pseudotaquilitos.

Pseudotaquilitos
As rochas cataclásticas, agrupadas na série cataclástica, podem ser classificadas de acordo com a sua coesão, o tamanho dos seus clastos e a percentagem clastos/matriz. Esta classificação dá uma ideia aproximada da intensidade da deformação.

Série Cataclástica



    Formação das Rochas Cataclásticas
    O esquema acima não é considerado correto, na atualidade. Milonitos não são exatamente rochas cataclásticas, ainda que tenham sido assim consideradas por Sibson. Os milonitos são subdivididos com base na proporção dos grãos originais, de tamanho grande, e da matriz recristalizada. Os milonitos são foliados e comumente apresentam lineações e abundantes  evidências de processos de deformação plástica, em vez de deslizamento friccional e moagem de grãos. Os milonitos formam-se a profundidades e temperaturas maiores que os cataclasitos e as demais rochas de falha, e acima de 300 ºC para rochas ricas em quartzo.

    Brecha de falha é uma rocha inconsolidada com <30% de matriz. Se a razão matriz-fragmentos for maior, a rocha é denominada gouge de falha. Um gouge de falha é uma versão intensamente moída da rocha original, mas esse termo pode também ser usado para camadas de argila ou folhelho intensamente modificadas em núcleos de falhas em rochas sedimentares.

    Essas rochas não são consolidadas na parte superior da crosta rúptil. Elas formam condutos para o fluxo de fluidos em rochas não porosas, mas contribuem para a redução da permeabilidade em rochas porosas.

    Pseudotaquilito é uma rocha escura, densa, vítrea ou microcristalina. Ela se forma pela fusão local das paredes da rocha pelo atrito do deslizamento. O pseudotaquilito pode apresentar injeções de veios em suas laterais, bordas congeladas, fragmentos de rochas encaixantes e estruturas vítreas. Essa rocha ocorre tipicamente em zonas de espessura milimétrica a centimétrica que fazem contato brusco com a rocha encaixante. Os pseudotaquilitos formam-se tipicamente na parte superior da crosta, mas também podem formar-se em profundidades maiores, nas regiões anidras da crosta inferior.

    As crush breccias são caracterizadas por fragmentos grandes. Elas têm menos de 10% de matriz e são rochas coesas e duras. Os fragmentos são unidos por um cimento (geralmente de quartzo ou calcita) e/ou por microfragmentos que foram moídos durante o falhamento.

    Cataclasitos são diferentes das crush breccias pela sua menor razão fragmentos-matriz. A matriz é formada por microfragmentos moídos, que constituem uma rocha maciça com aspecto de sílex. É necessária uma certa temperatura para que a matriz assuma um aspecto de sílex e, portanto, considera-se que a maioria dos cataclasitos tenha se formado a 5 km de profundidade ou mais.