Quebra Pedras

BLOG DEDICADO A ALUNOS DE GEOLOGIA

segunda-feira, 31 de agosto de 2020

ORIGEM DOS OCEANOS

 O mistério da origem dos oceanos terrestres

 

As rochas do disco que se formou ao redor do Sol primitivo continham os elementos que permitiram a existência da água na Terra. University of Copenhagen/Lars Buchhave
As rochas do disco que se formou ao redor do Sol primitivo continham os elementos que permitiram a existência da água na Terra. University of Copenhagen/Lars Buchhave.

DANIEL MEDIAVILLA

28 AGO 2020 - 11:11 BRT

Há teorias que afirmam que não deveríamos existir, ou pelo menos sugerem que nossa vida hoje não parecia estar nos planos iniciais. Uma delas é a do Big Bang, que diz que na origem do universo se criou a mesma quantidade de matéria e antimatéria. Quando uma partícula encostava em sua antipartícula, se desintegrava, tornando impossível a acumulação de átomos que possibilitou o mundo que conhecemos. Um fenômeno ainda sem explicação desfez esse empate e permitiu nossa existência, mas ainda havia obstáculos a superar antes de se tornar realidade. Outro acontecimento afortunado é que o cobriu a Terra de oceanos e a tornou fértil à vida. Os modelos de formação do Sistema Solar estimam que a água deveria ser escassa nos planetas mais próximos à estrela, mas é óbvio que, pelo menos no nosso, não é assim.

Nas tentativas para explicar essa feliz anomalia, o estudo científico sugere que há 3,9 bilhões de anos a Terra sofreu um intenso bombardeio de asteroides e cometas que trouxeram com eles água e elementos orgânicos que, somente 400 milhões de anos depois, permitiram que a vida aparecesse. Para se acomodar às teorias de formação de nosso sistema planetário, se colocava que os meteoritos, conhecidos como condritos carbonáceos, chegavam das fronteiras externas do sistema solar, onde o calor da estrela não teria volatilizado a água como nas regiões interiores. Agora, um trabalho publicado na revista Science aponta outro tipo de asteroide como fonte do composto líquido essencial à vida que conhecemos.

A hipótese de que foram meteoritos e cometas longínquos que encheram a Terra de água requer um complexo processo de influências gravitacionais entre os planetas gigantes e os corpos celestes para atraí-los para cá de suas órbitas distantes. Laurette Piani e uma equipe do Centro Nacional de Pesquisa Científica (CNRS, na sigla em francês) e da Universidade de Lorena (França), tentaram justificar outra das possibilidades propostas para explicar que este seja o planeta azul.

A Terra se formou a partir do amálgama de materiais que se encontravam na nebulosa que deu origem ao Sistema Solar. “Hoje sabemos que os planetas terrestres, entre eles a Terra, não se formam subitamente, e sim com a agregação de centenas de corpos”, diz Josep Maria Trigo, pesquisador principal do grupo de corpos menores e meteoritos do Instituto de Ciências do Espaço (CSIC-IEEC, nas siglas em espanhol), em Barcelona. “Os corpos que formaram a Terra se formaram a uma distância menor do Sol e em 80 a 90% seriam condritos de enstatita [o mineral mais abundante neles] e ordinários”, acrescenta.

No começo, por sua formação próxima ao Sol, se pensava que nas rochas fundamentais com as quais se construiu a Terra não existiria água suficiente para explicar sua abundância em nosso planeta. A análise de Piani e seus colegas, entretanto, sugere que nessas rochas primevas haveria hidrogênio suficiente para trazer à Terra até três vezes a massa de água que hoje os oceanos contêm. Para realizar essa afirmação com solidez, os pesquisadores mediram com precisão as concentrações e as proporções de hidrogênio e deutério (uma versão do hidrogênio com um nêutron acompanhando o próton) em treze meteoritos provenientes de asteroides de enstatita. Além de comprovar que tinham quantidades suficientes de hidrogênio, observaram que as quantidades de isótopos de hidrogênio e nitrogênio coincidem com as do manto terrestre.

Os autores reconhecem que não podem calcular quando ocorreu a chegada desses asteroides portadores dos elementos necessários para a aparição da água terrestre, mas estimam que ocorreu em um período suficientemente tardio da formação da Terra. Jesús Martínez Frías, pesquisador do CSIC e diretor da Rede Espanhola de Planetologia e Astrobiologia, diz que se o bombardeio ocorresse muito cedo, antes de 3,8 bilhões de anos, a água teria se evaporado. “O bombardeio posterior à acumulação dos primeiros planetesimais destruiu a crosta primitiva, o vapor de água e outros gases escaparam e formaram a atmosfera e a água da Terra”, afirma. “Além disso, se misturou com outros fluidos procedentes do subsolo através do vulcanismo e todas essas emissões voláteis enriqueceram essa atmosfera primitiva”, acrescenta.

O fato de que a maior parte da água terrestre venha desses condritos da região do Sistema Solar próximo à Terra não descarta a função cumprida pelos que vieram das áreas mais frias e longínquas. “As enstatitas foram importantes para criar condições de habitabilidade trazendo a água, mas os carbonáceos, que têm aminoácidos, ureia, purinas, são mais importantes para tornar possível a origem da vida”, diz. Trigo, que considera muito relevante o trabalho publicado agora pela Science, diz que isso pode significar que “os condritos carbonáceos teriam fornecido uma quantidade menor, mas significativa, de 5 a 10%, dessa água e nitrogênio [da Terra], ainda que poderiam tê-lo feito mais tarde, fruto das contínuas colisões com outros objetos ao longo da história da Terra”.

Para conhecer melhor essa etapa crítica da história do planeta, será preciso viajar a asteroides para pegar amostras com as quais será possível fazer medições ainda mais precisas que as da equipe de Piani. Como diz Frías, quando for possível visitar asteroides com certa regularidade cada tipo terá seu interesse: “Os asteroides metálicos são mais interessantes para procurar recursos minerais como os metais de terras raras, os que dão origem aos condritos carbonáceos interessam do ponto de vista da origem da vida e as enstatitas para nos explicar como a Terra começou a ser habitável”.

Obtido em:

https://brasil.elpais.com/ciencia/2020-08-28/o-misterio-da-origem-dos-oceanos-terrestres.html

sexta-feira, 28 de agosto de 2020

 

Cientistas reduzem a idade do núcleo interno da Terra

Novo estudo aponta que a idade do núcleo interno deve estar entre 1 bilhão e 1,3 bilhão de anos

Na história de 4,5 bilhões de anos da Terra, em algum momento o seu núcleo de ferro totalmente líquido resfriou o suficiente para formar uma bola sólida no centro. Hoje, o núcleo interno da Terra consiste em um núcleo interno de ferro sólido cercado por um núcleo externo de ferro derretido.

Mas determinar exatamente a data dessa mudança é muito difícil.

Idade do núcleo interno da Terra

núcleo interno da Terra

As estimativas costumavam variar de 4,5 bilhões de anos atrás – a idade da própria Terra – a 565 milhões de anos atrás.

Agora, de acordo com um novo estudo e com dados obtidos em experimentos de laboratório que criam condições próximas às do núcleo planetário, a idade do núcleo interno da Terra reduziu e deve estar entre 1 bilhão e 1,3 bilhão de anos.

Então, esses novos dados também ajudam a reduzir a idade do geodínamo, que alimenta o campo magnético ao redor da Terra.

É este campo magnético que contribui para as condições favoráveis à vida como a conhecemos e protege a atmosfera do planeta de ser soprada pelo vento solar.

Por causa disso, o interesse profundo dos cientistas pela sua existência e como ele é mantido não é surpresa.

Campo magnético da Terra

campo magnético

O geocientista Jung-Fu Lin, da Universidade do Texas em Austin, expressou a curiosidade e o entusiasmo de todos em saber a origem do geodínamo, a força do campo magnético e porque todos eles contribuem para a habitabilidade do planeta.

A princípio, o geodínamo é criado pela circulação de ferro condutor no núcleo externo, impulsionado por convecção que é alimentado por dois mecanismos.

Em primeiro lugar, existe a convecção térmica. Ela é gerada por flutuações de temperatura que podem ocorrer em um núcleo totalmente líquido.

Em segundo lugar, há a convecção composicional, na qual os elementos mais leves liberados no limite do núcleo interno se elevam através do núcleo externo líquido e criam o movimento.

Em ambos os casos, é esse líquido condutor que cria as correntes elétricas que carregam o núcleo e o transforma em um eletroímã gigante.

E então, temos o campo magnético. Atualmente, os dois tipos de convecção estão presentes no núcleo da Terra e contribuem igualmente para o geodínamo.

Temperatura do núcleo interno da Terra

Terra

Antes que o núcleo sólido se cristalizasse, apenas a convecção térmica era possível no núcleo da Terra.

O geodínamo já era gerado, mas para mantê-lo por bilhões de anos, o ferro teria que ser extremamente quente. Isso é necessário para que as estimativas mais recentes da idade do núcleo interno sejam confirmadas.

Logo, para conduzir e manter essas temperaturas, a condutividade térmica do ferro (capacidade de conduzir calor com eficiência) precisa ser alta.

Portanto, a equipe decidiu examinar a condutividade térmica do ferro sob pressão e em temperaturas próximas às do núcleo.

Para fazer isso, pegaram uma amostra de ferro, explodiram com lasers para aquecê-la e a esmagaram em uma bigorna de diamante.

Essas tentativas duraram dois anos, ou seja, é muito mais trabalhoso do que parece.

Finalmente, a equipe conseguiu medir a condutividade elétrica e térmica da amostra sob 170 gigapascals de pressão (que é 170 milhões de vezes a pressão atmosférica ao nível do mar) e temperaturas de 3.000 Kelvin.

Conclusão do estudo

As pressões no núcleo externo variam de 135 a 330 gigapascais do limite externo até o limite do núcleo interno, enquanto as temperaturas variam de 4.000 a 5.000 Kelvin.

O núcleo interno pode alcançar mais de 6.000 Kelvin, lembrando que o ferro se solidifica sob pressão intensa.

Quando a equipe mediu a condutividade na amostra, eles descobriram que era 30 a 50% menor do que o que seria necessário para a estimativa de idade de 565 milhões de anos para o núcleo interno da Terra ser confirmado.

Consequentemente, os pesquisadores poderiam testar um limite superior na condutividade térmica do ferro líquido sob as condições do núcleo. Por sua vez, colocaria um limite superior na quantidade de calor que pode ser conduzida e retida.

Com tudo isso, eles puderam estimar a idade do núcleo interno da Terra, finalmente.

Lin definiu que “Uma vez que você realmente sabe quanto desse fluxo de calor vai do núcleo externo para o manto inferior, você pode realmente pensar sobre quando a Terra esfriou o suficiente a ponto de o núcleo interno começar a cristalizar”.

A pesquisa foi publicada na Physical Review Letters. Informações em Science Alert.

Obtido em: https://socientifica.com.br/cientistas-reduzem-a-idade-do-nucleo-interno-da-terra/

sexta-feira, 21 de agosto de 2020

EXTINÇÃO

 Assim foi o primeiro dia na Terra depois do asteroide que acabou com os dinossauros

por Miguel Ángel Criado | El País | Publicada em 11/09/2019 às 17h04

Um estudo reconstitui minuto a minuto o que se passou há 66 milhões de anos, graças a um cilindro de rocha extraído da zona do impacto. O Seguinte: reproduz o artigo publicado pelo El País. Ao fim, também tem um vídeo

Cerca de 66 milhões de anos atrás, um milênio a mais ou a menos, um asteroide atingiu a Terra no que hoje é o Golfo do México. O choque foi de tal magnitude que a teoria dominante entre os cientistas indica que causou o desaparecimento de 75% da vida, a começar pelos dinossauros. Agora, o estudo de um cilindro de rocha extraído da cratera causada pelo impacto permitiu reconstituir minuto a minuto que se passou há tanto tempo. E foi um verdadeiro inferno.

Em 2016, a Expedição 364 à cratera Chicxulub, no noroeste da Península de Yucatán (México), perfurou a zona de impacto. Não cavaram na parte central, mas na borda externa da cratera. Extraíram um cilindro rochoso de uns 1.334 metros abaixo do fundo do mar. Segmentado em partes, seu estudo por um grande grupo de geólogos e cientistas de outros campos conta a história em capítulos tão precisos como os dos anéis de árvores ou núcleos extraídos do gelo, embora milhões de anos se tenham passado.

“É uma das vantagens com as crateras de impacto. Sua formação segue leis físicas muito bem definidas", diz o pesquisador do Centro de Astrobiologia/CSIC e coautor do estudo, Jens Olof Ormö. "Podemos reconstituir uma sequência de eventos [por exemplo, ver quais sedimentos seguem um acima do outro]. Pelo tipo de sedimento [tamanho dos clastos (fragmentos), tipo e classificação], podemos saber se o depósito foi rápido ou lento, e aproximadamente o tempo que isso levou", explica.

Em Chicxulub, o impacto do asteroide liberou uma energia equivalente à de 10 bilhões de bombas como a de Hiroshima. Volatilizou enormes quantidades de material. Estudos anteriores estimaram que liberou na atmosfera 425 gigatoneladas de CO2 e outras 325 de sulfuretos (uma gigatonelada equivale a 1 bilhão de toneladas métricas). Um penúltimo dado: o tsunami subsequente levou água do Caribe para os Grandes Lagos do norte dos Estados Unidos, a cerca de 2.500 quilômetros da zona de impacto.

O cilindro de sedimentos foi extraído de aproximadamente 1.300 metros sob o leito marinho e estudado por segmentos

Mas o que mais interessou aos geólogos foi a rapidez com que a maior parte da cratera foi preenchida com os restos do choque brutal. Estima-se que em apenas 24 horas o buraco tenha sido coberto com uma camada de cerca de 130 metros de sedimentos, que são os que eles estudaram agora. Aí está escrita a história do primeiro dia de vida na Terra após o impacto. Aí os geólogos estabelecem a divisão entre duas eras, a do mesozoico e a do cenozoico atual. E é aí que quase tudo indica que começou a extinção dos dinossauros e o surgimento dos mamíferos.

Segundo o estudo, publicado na PNAS, os 40-50 metros inferiores, formados por rochas fundidas e fragmentárias (lacunas) se depositaram minutos após o impacto. Uma hora mais tarde teria surgido outra camada de cerca de 10 metros, composta de suevite, rochas de vidro e outros materiais fundidos. Horas depois, outros 80 metros foram preenchidos com sedimentos mais finos. No final do dia, o refluxo da água retirada com o impacto arrastou até ali enormes quantidades de material da região e áreas muito remotas.

Entre os últimos sedimentos, os pesquisadores encontraram uma grande quantidade de material orgânico, especialmente um rastro de fungos e muito carvão vegetal. Isso deve ter vindo dos restos dos incêndios causados pelo impacto e pela queda de materiais incandescentes nas florestas de centenas de quilômetros ao redor.

"Com um asteroide de 12 quilômetros atingindo Yucatán, os efeitos locais devem ter sido catastróficos e provavelmente também em distâncias de até 1.500 quilômetros do impacto, onde o impacto térmico pode ter provocado a queima das árvores. Em distâncias maiores, o material ejetado também teria causado incêndios por atrito à medida que caía na atmosfera. Mas esses efeitos devem ter sido de curta duração e não podem explicar a extinção global de 75% da vida", diz em um e-mail, o principal coautor do estudo, o professor do Instituto de Geofísica da Universidade do Texas (EUA), Sean Gulick.

Essa parte da história começou naquele dia, mas deve ter durado anos. Na rocha extraída das bordas internas da cratera Chicxulub há uma notável ausência de materiais sulfurosos. Não há vestígios de enxofre na área e o momento do impacto, embora as rochas ricas em sulfeto sejam abundantes. Esses dados reforçam a teoria de que o asteroide expeliu enormes quantidades de sulfetos na atmosfera, impedindo a radiação solar e resfriando o planeta. As simulações indicam que a temperatura média global caiu 20 graus e assim permaneceu durante uns 30 anos.

"Estamos diante de evidências empíricas da conexão entre o impacto do asteroide e a grande extinção", diz o pesquisador da UNAM (Universidade Nacional Autônoma do México) e um dos líderes do grupo de pesquisa, Jaime Urrutia, que está estudando a cratera de Chicxulub há várias décadas. Para ele, a grande contribuição deste trabalho é a resolução temporal que oferece sobre a sequência de eventos que se seguiram a um impacto ocorrido há 66 milhões de anos e que marcou o destino do planeta.

 

Siga o vídeo: https://youtu.be/7Ul9VZizFyc


 

quinta-feira, 23 de julho de 2020

OS GEÓLOGOS E A CIVILIZAÇÃO

Os geólogos e a dimensão civilizatória de suas atividades profissionais, artigo de Álvaro Rodrigues dos Santos


[EcoDebate] Em sua magnífica obra, Novum Organum (O Novo Método), Francis Bacon (1561 – 1626), notável e influente filósofo e cientista inglês, sentenciou: “Nature to be commanded must be obeyed”, “A Natureza para ser comandada precisa ser obedecida”.
Detendo-nos na frase de Francis Bacon, expressão que revela a maravilhosa capacidade de percepção e síntese própria dos sábios, podemos entendê-la como a essência científica e metodológica do trabalho dos geólogos.
Para o atendimento de suas necessidades (energia, transporte, alimentação, moradia, segurança física, comunicação…) o Homem é inexoravelmente levado a utilizar-se de uma série de recursos naturais (água, petróleo, minérios, energia hidráulica, solos…) e a ocupar e modificar espaços naturais das mais diversas formas (cidades, agricultura, indústria, minerações, usinas elétricas, vias de transportes, portos, canais, disposição de rejeitos ou resíduos…), o que implica necessariamente em interferir na natureza geológica e em seus processos dinâmicos, condição que já o transformou no mais poderoso agente geológico hoje atuante na superfície do Planeta. Para que esse “comando” da natureza seja coroado de êxito, suas intervenções devem incorporar (obedecer) as leis que regem as características geológicas dos materiais e dos processos geológicos naturais afetados.
Para obedecê-las (as Leis da Natureza), entendê-las, ou seja, estudar e compreender o meio geológico que deverá sofrer determinada intervenção e como esse meio reagirá frente às novas solicitações que lhe serão impostas; de tal forma a traduzir esses conhecimentos nas atitudes comportamentais e nas soluções de engenharia a serem adotadas. Será assim o trabalho do geólogo a condição elementar para que as atividades humanas dessa ordem sejam inteligentes, exitosas e provedoras da qualidade de vida no planeta, para essa e para as futuras gerações.
Hans Closs-(1885- 1951), eminente geólogo alemão, em consonância com a postulação de Francis Bacon, elevou o trabalho dos geólogos ao patamar de uma responsabilidade civilizatória: “Só uns poucos tomam, por todos os demais, o encargo nobre e pleno da responsabilidade de custodiar a escritura sagrada da Terra, de lê-la e interpretá-la, pois o enlace consciente do homem com sua estrela está confiado a uma ciência em especial, a GEOLOGIA”.
Que todos os geólogos tenham a percepção da transcendência, da beleza e do alcance civilizatório de sua atividade profissional e das responsabilidades que, por decorrência de sua ciência mãe, a Geologia, lhes cabe abraçar e desempenhar.
Geól. Álvaro Rodrigues dos Santos (santosalvaro@uol.com.br)
  • Ex-Diretor de Planejamento e Gestão do IPT – Instituto de Pesquisas Tecnológicas
  • Autor dos livros “Geologia de Engenharia: Conceitos, Método e Prática”, “A Grande Barreira da Serra do Mar”, “Diálogos Geológicos”, “Cubatão”, “Enchentes e Deslizamentos: Causas e Soluções”, “Manual Básico para Elaboração e Uso da Carta Geotécnica”, “Cidades e Geologia”
  • Consultor em Geologia de Engenharia e Geotecnia
  • Articulista da EcoDebate

in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 01/06/2020

segunda-feira, 15 de junho de 2020

DESCOBERTAS NOVAS ESTRUTURAS NO INTERIOR DA TERRA

Cientistas encontram estruturas não identificadas nas profundezas da Terra
Vinicius Szafran, editado por Fabiana Rolfini 12/06/2020 

Quase 30 anos de dados de terremotos foram analisados para investigar enormes e misteriosos objetos perto do núcleo do planeta

Cientistas descobriram uma enorme e densa estrutura que ocupa a fronteira entre o núcleo externo líquido da Terra e o manto inferior. Essa camada fica a cerca de três mil quilômetros abaixo da superfície.
Para encontrar tal estrutura, os pesquisadores contaram com o auxílio de um algoritmo de aprendizado de máquina, inicialmente desenvolvido para analisar galáxias distantes. A pesquisa foi publicada na revista Science.
Uma das anomalias, localizada nas profundezas das Ilhas Marquesas, na Polinésia Francesa, nunca havia sido encontrada antes. Descobriu-se também que uma outra estrutura similar, abaixo do Havaí, é na verdade muito maior do que o estimado anteriormente.
A equipe de pesquisadores, liderados por Doyeon Kim, sismólogo e pós-doutorando da Universidade de Maryland, alimentaram o algoritmo chamado "Sequencer" com sismogramas capturados de centenas de terremotos ocorridos entre 1990 e 2018. Embora estudos sismológicos tendam a se concentrar em conjuntos de dados relativamente pequenos da atividade regional de terremotos, o "Sequencer" permitiu a análie de sete mil terremotos, cada um com magnitude de pelo menos 6,5 pontos na escala Richter, que abalaram o subsolo do Oceano Pacífico nos últimos 30 anos.
"Este estudo é muito especial porque, pela primeira vez, conseguimos analisar sistematicamente um conjunto de dados tão grande, que realmente cobrem mais ou menos toda a bacia do Pacífico", afirmou Kim à Vice. Embora estruturas no fundo do planeta já tenham sido mapeadas, a pesquisa é uma oportunidade para "reunir tudo e tentar explicar em um contexto global", segundo o pesquisador.
Reprodução
Ilhas Marquesas. Imagem: Tom Patterson

Ondas de cisalhamento

Terremotos criam ondas sísmicas que viajam pelo interior da Terra, onde são espalhadas e distorcidas por estruturas profundas dentro do nosso planeta. Esses padrões distorcidos são capturados em sismogramas, permitindo que os sismólogos capturem vislumbres do subterrâneo inacessível do nosso planeta.
A equipe se concentrou nos dados produzidos pelas ondas de cisalhamento (S), que viajam ao longo da fronteira entre o núcleo e a porção inferior do manto da Terra. Essas são as ondas secundárias mais lentas que seguem os tremores iniciais, chamados de ondas primárias (P) e que produzem sinais mais claros.
A equipe procurou as ondas S difratando ao longo do manto principal. Quando as ondas S atingem essas estruturas, produzem um tipo de assinatura semelhante a um eco (chamado "pós-cursor"). Esses ecos indicam a presença de anomalias nas profundezas do planeta, denominadas zonas de velocidade ultra baixa (ULVZs), que são manchas densas no limite do núcleo.
Não se sabe exatamente como as ULVZs são formadas ou do que são feitas, mas sabe-se que elas têm diâmetros de cerca de 100 quilômetros e são densas o bastante para desacelerar as ondas que passam por elas.
Ao analisar milhares de dados no "Sequencer", os cientistas descobriram que os sinais pós-cursor mais fortes estavam no Havaí e nas Ilhas Marquesas. Isso evidencia a existência de duas "mega ULVZs", zonas com mil quilômetros ou mais.

Reprodução
Mapa do interior da Terra com base no novo estudo. Imagem: D. Kim, V. Lekíc, B. Ménard, D. Baron e M. Taghizadeh-Popp
As "mega ULVZs" são estruturas intrigantes não apenas por seu tamanho, mas porque podem ser compostas de materiais exóticos que remontam a um tempo antes de termos uma Lua. Essas enormes anomalias poderiam ser material parcialmente derretido que antecede o evento de formação da Lua, supostamente resultado de uma colisão gigantesca entre a Terra primitiva e um objeto do tamanho de Marte há mais de quatro bilhões de anos.
"Isso é muito interessante, porque pode indicar que as mega ULVZs são especiais e podem hospedar assinaturas geoquímicas primitivas que foram relativamente desmistificadas desde o início da história da Terra", explicou Kim.
O estudo demonstra as aplicações de algoritmos como o Sequencer, que usam um processo chamado aprendizado não supervisionado, para processar conjuntos de dados complexos como os de sismologia e astronomia. Ao contrário de algoritmos de aprendizado supervisionado, treinados para classificar as informações com base em rótulos conhecidos, os algoritmos não supervisionados são projetados para encontrar insights em conjuntos de dados não rotulados - basicamente, quando você não sabe ao certo o que está procurando.
A equipe planeja continuar desenvolvendo a nova técnica ao examinar ondas de frequência mais alta que podem fornecer mais detalhes sobre as estruturas entre o manto e o núcleo do planeta. Os pesquisadores também pretendem expandir seus conjuntos de dados para sismogramas do Oceano Atlântico.

domingo, 31 de maio de 2020

MUDANÇAS NO CAMPO MAGNÉTICO TERRESTRE

Uma estranha anomalia está enfraquecendo o campo magnético da Terra

O campo magnético da Terra continua sendo afetado por uma anomalia misteriosa, flagrada por um satélite da Agência Espacial Europeia (ESA). Aliás, os dados coletadas indicam que o fenômeno estranho tem se agravado nos últimos tempos.
A Anomalia do Atlântico Sul se estende desde a América do sul até o sudoeste da África, sendo uma vasta extensão de intensidade magnética reduzida. O campo magnético da Terra atua como se fosse um escudo protegendo o planeta de ventos solares e da radiação cósmica, por isso qualquer alteração precisa de monitoramento.
Por enquanto, não há nada de preocupante, indica a ESA. Entretanto, os principais efeitos podem causar falhas nos satélites e nas naves espaciais, que podem ser expostos a uma maior quantidade de partículas carregadas. Isso desde que passem nos céus do Oceano Atlântico Sul.

O campo magnético da Terra está mais fraco?

Pesquisas indicam que durante os últimos dois séculos o campo magnético da Terra reduziu cerca de 9%. Além disso, somente nos últimos 50 anos a redução foi de 24.000 nanoteslas para 22.000 nanoteslas. Isso foi auxiliado pela Anomalia do Atlântico Sul.
Entretanto, os pesquisadores da ESA ainda não conseguiram identificar porque essa condição está acontecendo. Mas, eles sabem que o campo magnético da Terra é produzido por correntes elétricas geradas dentro do núcleo externo de nosso planeta. E embora a condição seja estável, em escalas de tempo existem alterações.

Alterações como essa são normais

Estudos indicaram que o campo magnético da Terra constantemente sofre alterações, mudando a cada centenas de milhares de anos. Além disso, os polos magnéticos norte e sul costumam trocar de lugar.
A questão é que os pesquisadores não conseguem fazer a junção dessa condição com a Anomalia do Atlântico Sul, que poderia ser causada por um reservatório de rochas densas na África. Mas, eles sabem que a anomalia não está parada e desde 1970 vem se movendo para oeste, numa velocidade de 20 quilômetros por ano.
Nos últimos 5 anos um segundo centro de intensidade mínima começou a se abrir dentro da anomalia, fato indicado pelo satélite Swarm, da ESA. Assim, pode ser um procedimento para que a anomalia se divida em duas células separadas, com o original acima da América do Sul e a nova célula chegando ao sudoeste da África.
“O novo mínimo oriental da Anomalia do Atlântico Sul apareceu na última década e, nos últimos anos, está se desenvolvendo vigorosamente”, diz o geofísico Jürgen Matzka, do Centro Alemão de Pesquisa em Geociências.
Os pesquisadores adotam como desafio a compreensão dos processos que acontecem no núcleo da Terra e que permitem essas mudanças. Por enquanto eles ainda não sabem quais serão os próximos passos da anomalia, mas sugerem que um evento como este é comum, se pensarmos ao longo de centenas de anos.
De fato, os cientistas vão continuar analisando essa anomalia, até que tudo fique mais claro e respostas sejam dadas.
Acesse o site da ESA para saber mais.
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