O termo deformação é usado de diversas maneiras por diferentes pessoas e em circunstâncias variadas, assim como vários outros termos em Geologia Estrutural. Na maioria dos casos, particularmente em campo, o termo diz respeito à deformação (strain) visível em uma rocha deformada. Isso é, também, o que o termo realmente significa: uma mudança na forma. Entretanto, as massas rochosas podem ser transladadas ou rotacionadas como unidades rígidas durante uma deformação, sem qualquer mudança interna na forma. Por exemplo, os blocos de falha podem mover-se durante a deformação sem acumular deformação interna. Muitos geólogos estruturalistas preferem incluir esses deslocamentos rígidos no termo deformação, e nos referimos a eles como deformação de corpo rígido, em oposição à deformação de corpo não rígido (strain ou distortion).
A DEFORMAÇÃO É A TRANSFORMAÇÃO DE UMA GEOMETRIA INICIAL EM UMA GEOMETRIA FINAL POR MEIO DE TRANSLAÇÃO OU ROTAÇÃO DE CORPO RÍGIDO, DEFORMAÇÃO INTERNA (strain, distortion) E/OU MUDANÇA DE VOLUME.
É conveniente pensarmos em uma rocha ou unidade rochosa em termos de um contínuo de partículas. A deformação diz respeito às posições antes e depois da história da deformação – e as posições dos pontos antes e depois da deformação podem ser conectadas por vetores. Estes são chamados de vetores de deslocamento, e um campo de vetores é conhecido como campo de deslocamento.
Componentes de deformação
A translação desloca todas as partículas da rocha na mesma direção e por uma mesma distância, e seu campo de deslocamento é definido por vetores paralelos e de mesmo comprimento. São exemplos clássicos as nappes de cavalgamento, com enormes deslocamentos, e, em escala menor, os componentes das rochas (grãos minerais, camadas, blocos de falha), que podem ser transladados ao longo de planos de rejeito ou falhas planas sem qualquer mudança interna da forma.
O termo rotação é usado em referência à rotação rígida do volume inteiro de rocha deformada. A rotação rígida envolve uma rotação física uniforme de um volume de rocha (como uma zona de cisalhamento) em relação a um sistema externo de coordenadas.
As rotações em larga escala de uma grande nappe de cavalgamento ou de uma placa tectônica inteira ocorrem tipicamente em torno de eixos verticais. Os blocos de falha em contextos extensionais, por outro lado, podem estar rotacionados em torno de eixos horizontais, e rotações de pequena escala podem ocorrer em torno de eixos de qualquer posição.
Deformação interna (strain)
A deformação interna (strain, distortion) é aquela não rígida, e possui uma definição simples:
QUALQUER MUDANÇA NA FORMA, COM OU SEM MUDANÇA NO VOLUME, É UMA DEFORMAÇÃO INTERNA (strain), E INDICA QUE AS PARTÍCULAS EM UMA ROCHA MUDARA DE POSIÇÃO EM RELAÇÃO UMAS ÀS OUTRAS.
Um volume de rocha pode ser transportado (transladado) e rotacionado rigidamente de vários, modos, mas não seríamos capazes de defini-los olhando apenas para a rocha. Toda a deformação que podemos observar em campo ou em uma amostra representa uma deformação interna (strain) e, talvez, o modo como ela se acumulou. Considere uma marmita de almoço. Você pode levá-la para a escola ou para o trabalho, o que representa uma significativa translação e rotação, mas não pode ver esses tipos de deformação diretamente. Se sua marmita tiver sido acidentalmente espremida durante o trajeto, você poderá perceber isso ao comparar seu estado atual com o anterior, referente ao momento em que você saiu de casa. Se outra pessoa preparou o seu almoço e o colocou na marmita, você usaria seu conhecimento da disposição dos alimentos para estimar a deformação interna (strain, mudança de forma) envolvida.
Este último ponto é muito relevante, porque, com poucas exceções, não vemos a rocha deformada em seu estado não deformado. Precisamos usar nosso conhecimento do aspecto típico das rochas quando não deformadas. Por exemplo, se encontrarmos oólitos ou manchas de redução deformados em uma rocha, é provável que tenham sido esféricos (circulares, em seção) em seu estado não deformado.
Variação de volume
Nos estudos de deformação, devemos escolher um sistema de referência ou de coordenadas. Se estivermos de pé sobre uma doca, um grande navio chegando ou partindo pode dar a impressão de que a doca está se movendo, e não o navio. Inconscientemente, nosso sistema de referência se mantém fixo no navio, e o resto do mundo se movimenta por translação em relação a ele. Mesmo que possa ser fascinante, essa escolha de referência não é muito útil. A deformação de uma rocha também deve ser considerada dentro de um sistema de coordenadas de referência, que deve ser escolhido com cuidado para manter baixo o nível de complexidade.
É conveniente orientar o sistema de coordenadas de acordo com importantes estruturas geológicas, como a base de uma nappe de cavalgamento, um limite de placa ou uma zona de cisalhamento local. Em muitos casos, opta-se por eliminar a translação e a rotação rígida.
Deformação homogênea e heterogênea
Quando a deformação aplicada a um volume de rocha é idêntica em todo o volume, a deformação é homogênea. A rotação rígida e a translação são, por definição, homogêneas; portanto, somente a deformação interna (strain) e as variações de volume ou área podem ser heterogêneas. Assim, deformação homogênea e deformação interna homogênea são expressões equivalentes.
Na deformação homogênea, linhas originalmente retas e paralelas continuam como tais após a deformação (figura abaixo). Além disso, a deformação interna e a mudança de volume/área são constantes em todo o volume de rocha considerado – o que, se não ocorrer, caracterizará a deformação heterogênea. Isso significa que dois objetos com forma e orientação iniciais idênticas permanecerão assim após a deformação. Note, entretanto, que a forma e a orientação iniciais, em geral, diferem da forma e da orientação finais. Se dois objetos tiverem forma idêntica, mas diferentes orientações antes da deformação, então, terão, geralmente, diferentes formas depois dela, mesmo que ela seja homogênea. Um exemplo são os braquiópodes deformados da figura abaixo. A diferença reflete a deformação interna (strain) imposta à rocha.
DEFORMAÇÃO HOMOGÊNEA: LINHAS RETAS PERMANECEM RETAS, LINHAS PARALELAS PERMANECEM PARALELAS E OBJETOS COM FORMAS E ORIENTAÇÕES IDÊNTICAS PERMANECEM COM FORMAS E ORIENTAÇÕES IDÊNTICAS APÓS A DEFORMAÇÃO.Entretanto, um ponto deve ser enfatizado:
UMA DEFORMAÇÃO HOMOGÊNEA EM UMA ESCALA PODE SER CONSIDERADA HETEROGÊNEA EM OUTRA.
Um exemplo clássico é o aumento da deformação interna (strain) em uma zona de cisalhamento, que geralmente ocorre da margem em direção ao centro. A deformação é heterogênea nessa escala, mas pode ser subdividida em zonas mais delgadas, onde a deformação é aproximadamente homogênea.
Deformação interna unidimensional
Em uma dimensão (única direção), a deformação interna (strain) refere-se ao estiramento e ao encurtamento (estiramento negativo) de linhas ou objetos aproximadamente lineares (retilíneos). Podemos dizer que a deformação interna (strain) unidimensional não faz sentido, uma vez que uma linha reta estendida não muda de forma, somente de comprimento. Por outro lado, uma mudança em forma, como um círculo se transformando em elipse, pode ser descrita pela mudança de comprimento de linhas de diferentes orientações. É, portanto, conveniente incluir a variação de comprimentos de linhas no conceito de deformação interna (strain).
Há termos especiais que são usados, como elongação, extensão, estiramento, contração, encurtamento e, como qualquer outra grandeza relativa à deformação, eles são adimensionais.
Deformação interna (strain) em duas dimensões
A observação de deformação interna (strain) em planos ou seções é descrita pelas seguintes quantidades adimensionais:
a) Cisalhamento angular (angular shear), ψ (psi, letra grega) ocorre quando há variação de ângulo entre um par de linhas originalmente ortogonais antes da deformação (figura acima). Mais especificamente, o cisalhamento angular ao longo de uma linha de referência é a variação do ângulo de uma linha perpendicular a essa linha de referência antes da deformação. A deformação por cisalhamento pode ser determinada onde há objetos com relações angulares conhecidas.
NA DEFORMAÇÃO COAXIAL, AS LINHAS AO LONGO DOS EIXOS PRINCIPAIS DE DEFORMAÇÃO MANTÊM A MESMA ORIENTAÇÃO DE SEU ESTADO INDEFORMADO.
O cisalhamento puro é uma deformação uniaxial perfeita, onde um marcador paralelo a um dos eixos principais não sofre rotação a partir de sua posição original. A deformação uniaxial, onde a rocha é encurtada ou estendida em uma direção, é outro exemplo de deformação coaxial. (Figura anterior)
O cisalhamento puro é uma deformação plana (bidimensional) sem variação de volume, embora alguns geólogos apliquem esse termo a deformações coaxiais tridimensionais. O cisalhamento puro equivale a um encurtamento em uma direção, compensado por extensão em outra.
EM DEFORMAÇÃO NÃO COAXIAL, A ORIENTAÇÃO DOS EIXOS PRINCIPAIS DE DEFORMAÇÃO É DIFERENTE EM DIFERENTES QUANTIDADES DE DEFORMAÇÃO, ENQUANTO NA DEFORMAÇÃO COAXIAL OS EIXOS SEMPRE APONTAM NAS MESMAS DIREÇÕES (MESMA ORIENTAÇÃO, DIFERENTES COMPRIMENTOS).
O cisalhamento simples é um tipo especial de deformação interna (strain) plana de volume constante. Não há estiramento ou encurtamento de linhas ou movimento de partículas na terceira direção. É uma deformação não coaxial, o que significa que linhas paralelas aos eixos principais de deformação são rotacionadas a partir de suas posições iniciais. (Figura anterior)
b) A elipse de deformação é a elipse que descreve a quantidade de elongação em qualquer direção num plano de deformação homogênea. Ela representa a deformação de um circula imaginário inicial na seção não deformada. Ela é definida pelos seus eixos mais longo (X) e mais curto (Y).
c) Variação de área: em uma variação em área sem qualquer deformação, R=X/Y=1. Após uma deformação por pura variação de área, um círculo desenhado na seção inicial permanece um círculo, ainda que com um raio menor ou maior. Em um diagrama simples XY, as deformações por pura variação de área situam-se ao longo da diagonal principal (veja figura abaixo. O mesmo diagrama ilustra os campos de deformação característicos para diferentes combinações de variação em área e deformação interna (strain).
Sempre será possível decompor uma deformação em algumas combinações de variação em área e deformação interna, ou seja isolar os componentes de deformação interna e de variação em área. A figura a seguir mostra como a compactação pode ser decomposta em deformação interna e variação em área.
Deformação interna (strain) tridimensional
O espectro de estados possíveis de deformação amplia-se significativamente se admitirmos estiramento e contração em três dimensões. As situações clássicas de referência são conhecidas como extensão uniforme, achatamento uniforme e deformação plana (figura a seguir).
A extensão uniforme é um estado de deformação onde o estiramento em X é compensado por igual encurtamento no plano ortogonal a X. O achatamento uniforme é o oposto, com encurtamento em uma direção Z compensado por estiramento idêntico em todas as direções perpendiculares a Z. Esses dois estados de referência são os membros extremos de um espectro contínuo de tipos de deformação. Entre o achatamento e a extensão uniformes existe a deformação plana, onde o estiramento em uma direção é perfeitamente compensado por encurtamento numa direção perpendicular. A deformação é “plana” ou bidimensional porque não há estiramento nem encurtamento na terceira direção principal, ou seja, ao longo do eixo Y.
A DEFORMAÇÃO É CONSIDERADA PLANA (BIDIMENSIONAL) ONDE NÃO HÁ VARIAÇÃO DE COMPRIMENTO AO LONGO DO EIXO Y, ENQUANTO A DEFORMAÇÃO TRIDIMENSIONAL IMPLICA VARIAÇÃO DE COMPRIMENTO AO LONG DE X, Y E Z.
Este texto foi extraído e modificado a partir de: FOSSEN, H. Geologia Estrutural. São Paulo : Oficina de Textos, 2012.
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